A porta do nosso céu

“Abril azul”, um mês criado para conscientizar as pessoas sobre o autismo, que atinge cerca de 2 milhões de crianças no Brasil. Por ocasião desta data, oferecemos o testemunho de Dani, mãe do José Álvaro.

Dani, José Álvaro e Marcos

Casamos no ano de 2011, e por quatro anos vivemos a expectativa da chegada de um filho.

No ano de 2014 fomos a Beatificação de D. Álvaro del Portillo, primeiro sucessor de São Josemaria Escrivá. Numa exposição sobre a vida de D. Álvaro, havia um local para colocarmos cartas pedindo sua intercessão. Pedimos por várias coisas, pessoas e principalmente pela graça de um filho.

José Álvaro chegou em 2015. Unimos a graça alcançada por essa intercessão e a descoberta da gravidez no dia de São José.

Foi uma gestação repleta de cuidados, devido a um sangramento logo no início, até o dia 07 de outubro, dia de Nossa Senhora do Rosário. Durante um exame, nesse mesmo dia, para escutar o coração do bebê, o médico percebeu algo errado, entrou em contato com a obstetra e seguimos direto para o hospital. José Álvaro estava em sofrimento fetal. Com 34 semanas e cinco dias, ele nasceu, foi reanimado na sala de parto e foi para a UTI. Foi batizado pelo pai e na segunda noite de vida teve sete paradas cardíacas, uma após a outra. Naquela noite ficamos em oração pelo nosso pequeno.

Nessa época o WhatsApp era uma novidade e um grupo de supernumerárias do Rio de Janeiro, rezava intensamente mandando a todo momento estampas de D. Álvaro, mensagens de carinho, de confiança, de conforto. Uma amiga, ao longo de quase dois meses de internação, me falava umas palavras que ajudaram tanto e até hoje são relembradas em diversas ocasiões: “Senhor estamos em tuas mãos e não há melhores mãos para estar”.

Após vários exames realizados e com o quadro mais estabilizado, os médicos da UTI deram alta e dentre algumas solicitações, pediram que ele fosse estimulado imediatamente, para não ficar com sequelas motoras.

Tudo transcorria bem, quando com aproximadamente um ano e meio, a fisioterapeuta que realizava os atendimentos, pediu para avaliar junto ao neuro um possível quadro de autismo. Nosso chão caiu. Vivemos um luto dos nossos sonhos e expectativas em relação ao seu futuro. Começamos a psicomotricidade, fono, TO, musicoterapia, etc. Hoje sabemos que José Álvaro tem uma paralisia cerebral leve e um autismo secundário.

O horizonte é amplo, cansativo, as lutas são grandes, desafiadoras, mas não nos sentimos sós. Deus nos dá a graça necessária para seguir em frente, para começar e recomeçar.

Temos certeza que José Álvaro é a porta do nosso céu. Com certeza nos faz ser pessoas melhores. Ele é uma criança feliz, inteligente, sensível e tem uma característica marcante que é a de cativar a todos, desde os parentes, porteiros, amigos, professores, faxineiros, pessoas que frequentam a missa, pessoas que encontramos na rua, ninguém passa indiferente ao seu lado. Onde está o José? Ele não veio hoje? Ele faz falta. Essas palavras fazem parte do nosso cotidiano.

José Álvaro
José Álvaro

Um padre, falava numa meditação essa semana sobre a misericórdia. Falava das flores, algo belo, que preenche o ambiente onde estão, mas, não parece funcional, seria “algo a mais” que Deus colocou no mundo. Façamos um paralelo das flores com as crianças ditas atípicas em três aspectos: sua beleza, fragilidade e sensibilidade. Podemos e devemos explorar e descobrir as belezas, os detalhes que existe numa criança atípica, porque elas existem, e isso automaticamente despertará em nós os melhores sentimentos, sobretudo o da esperança. Vemos sua fragilidade porque muitas vezes não tem noção das suas ações e consequências. Isso gera um desejo de auxiliar, de acolher como algo precioso. Vemos a sensibilidade quando a criança é exposta às mesmas circunstâncias de uma criança típica, da sua idade, e sentimos, como é preciso respeitar seu tempo, a sua forma de perceber a realidade, pois eles têm um tempo e um olhar para o mundo diferente do “politicamente correto”. É preciso se conectar, entrar em sintonia com o seu mundo para compreendê-lo. É preciso muita paciência, perseverança e amor.

Em um mundo corrido, competitivo e individualista, aprendemos a ver o que os outros podem ser úteis, valorizando aqueles que são capazes de trazer algo como: dinheiro, prestígio, prazer, etc. Essas crianças são trigo, mesmo que muitos encarem como joio. Precisam ser respeitadas e amadas. Talvez seja uma grande oportunidade que Deus nos dá para nos tornarmos melhores, mais humanos, mais misericordiosos, acolhendo os seus desígnios e nos deixando transformar por Ele.

Agradecemos a Deus o dom da vida de José Álvaro e, só podemos dizer que vale a pena. O fator determinante no desenvolvimento dessas crianças, é o afeto que recebem. Isso fará com que se sintam seguros e amados, certos de que serão apoiados na busca pelo seu lugar no mundo e a missão que Deus reservou para cada um deles. Isso pode ser uma senda no caminho da reabilitação.