Homilia de Mons. Fernando Ocáriz, em memória do Bem-aventurado Álvaro

"Peçamos a Deus o coração de crianças". Homilia de Mons. Fernando Ocáriz, em memória do Bem-aventurado Álvaro del Portillo, pronunciada na basílica de Santo Eugênio, em Roma, no sábado 11 de maio de 2019.

Celebramos a festa do bem-aventurado Álvaro del Portillo, o queridíssimo Dom Álvaro. Quase cinco anos se passaram desde a sua beatificação. O tempo passa rapidamente, mas guardamos bem na memória aqueles dias de alegria passados em Madri.

Haveria muitos aspectos em que poderíamos nos concentrar ao recordar a vida de quem foi o primeiro sucessor de São Josemaria. Mas gostaria de me deter agora na sua confiança em Deus.

Os textos da Missa de hoje nos falam sobre esse aspecto, ao delinear a figura do bom pastor. Na primeira leitura, ouvimos as palavras do profeta Ezequiel. A situação do povo de Israel estava em um momento muito crítico. Jerusalém havia sido destruída e grande parte do povo havia sido deportada para o exterior. Os israelitas esperavam alguém capaz de levá-los de volta à sua terra. Contudo, os planos de Deus sempre superam nossos cálculos. Dessa vez, Ele diz através da boca de Ezequiel: "Eu mesmo buscarei meu rebanho. (...) Eu mesmo pastorearei minhas ovelhas. (...) Enfaixarei a que está ferida e curarei a doente "(Ez 34,11-16). O profeta, surpreendentemente, vai muito além do que seus contemporâneos poderiam esperar: chama o povo a que coloque a esperança diretamente em Deus e não nas soluções humanas.

Dom Álvaro era uma pessoa de grandes qualidades naturais e sobrenaturais. Sabia que a graça de Deus poderia fazer muito mais em sua vida do que ele poderia imaginar. Quando foi escolhido para ser o prelado do Opus Dei, disse: "Tenho grandes dificuldades, que são todos os meus pecados, mesquinharias e misérias. Mas eu sei que Deus Nosso Senhor (...) dá graças proporcionais ao que Ele pede a cada um".

No Evangelho que ouvimos, Jesus se apresenta como Bom Pastor. E às razões que o profeta nos deu para confiar em Deus, acrescenta mais uma: o pastor "dá a vida pelas ovelhas" (Jo 10,11). Assim, a imagem do pastor atinge seu ponto mais completo: Cristo é aquele que nos procura para nos carregar em seus ombros. Cristo é aquele que venda e cura nossas feridas. Cristo é o próprio Deus que dá a sua vida na Cruz por nós. Depois de proclamar isso no Evangelho, como não confiar em um Deus que dá a vida por nós?

O Papa, em numerosas ocasiões, incentivou-nos a considerar que, como escreve São Paulo, Deus é quem trabalha em nossa vida, tanto ao querer fazer algo bom, como ao colocá-lo em prática (cfr. Filip 2,13). Às vezes, especialmente em um momento de desânimo, pode acontecer que confiemos pouco na graça de Deus e tentemos apoiar-nos em outras seguranças (cfr. Gaudete et Exultate, n 50): em nossas forças, em nossas ideias, em nossos planos. O Senhor conta com tudo isso, mas também nos diz: Eu sou o Pastor em quem você pode confiar. Pode existir algo mais eficaz do que a Sua própria força?

Nesse sentido, o bem-aventurado Álvaro costumava usar uma jaculatória, que é uma clara manifestação dessa confiança no poder de Deus: "Obrigado, perdão, ajuda-me mais". São palavras que manifestam gratidão em face do que não merecemos, reconhecimento da nossa própria fraqueza e um pedido da força necessária para alcançar a maior felicidade, que é a união com Deus. São palavras que estão entre as primeiras que as mães ensinam a seus filhos pequenos. Vamos pedir a Deus esse coração de crianças que se sabem realmente incapacitadas sem a ajuda de seu pai. São Josemaria, quando em alguma reunião familiar se referia à sua necessidade da graça de Deus, dizia que vivia "com as mãos estendidas", pedindo a esmola do Senhor.

Peçamos, por intercessão de dom Álvaro, que nossa confiança no amor de Deus por nós seja, assim como a sua, cada dia mais profunda. Dessa forma, poderemos compreender melhor que o Senhor Jesus, o Bom Pastor, é quem nos guia e enche a nossa vida de fruto sobrenatural, que sempre nos chega pela mediação materna de Santa Maria.

Assim seja.