Santo Rosário: cena e contemplação no discurso

O livro Santo Rosário, escrito por Josemaria Escrivá é um texto que conduz o leitor ao encontro com Deus. Melhor: o autor realiza, através do discurso, diversos atos: o primeiro deles, contemplar; o último, fazer com que o leitor contemple.

1. INTRODUÇÃO

A finalidade do presente trabalho é a de tentar apreender a competência comunicativa do Santo Rosário e dos mecanismos de articulação e expressão do sentido do texto. Analisarei as duas primeiras cenas do livro.

2. FINALIDADE DO DISCURSO

Todo o discurso constitui uma determinada expressão semântica da realidade. Seguindo Aristóteles, poder-se-ia dizer que é a expressão significativa do ser das coisas: logos semantikos (De Interpretatione, 16 a).

Uma das capacidades da linguagem é precisamente a de falar com verdade em relação às coisas: dizer a verdade ou falsidade, tal como se apresenta na proposição ou juízo (De Int. 16 b), contudo, não é esta a única determinação possível do semântico. A literatura e outras criações artísticas mais do que falar sobre o mundo, estabelecem um mundo próprio. Isto é, enquanto falam, criam o seu próprio referencial: o logos semântico adquire assim a determinação de logos poietikós. Finalmente, uma terceira determinação do semântico é dirigida a atuar praticamente na realidade, a linguagem, neste caso, não só diz, mas também faz: executa uma determinada ação: logos pragmatikós.

Uma prece, afirma Aristóteles, não é nem verdadeira nem falsa (De Int. 17 a); antes, faz algo: dirige-se a Deus, suplica.

O livro de São Josemaria que estamos a considerar, Santo Rosário, é um discurso que se situa claramente como modelo acabado de logos pragmático. São textos que fazem, mais do que dizem. Que fazem? Simplesmente conduzem um leitor empírico ao encontro com Deus. Melhor, o autor realiza através do discurso diversos atos: o primeiro de entre eles, contemplar; o último, fazer que o receptor o contemple. Naturalmente, encontramo-nos neste caso com textos que têm beleza literária, mas não é esta a finalidade principal que o autor quis alcançar. A finalidade não é só estética. Há um proposto deliberado de comover o leitor, e conduzi-lo à contemplação. O autor di-lo claramente no Prólogo ao leitor.

“Vem comigo, e vivermos (este é o nervo da minha confidência) a vida de Jesus, de Maria e de José”.

Qualquer pessoa que conheça a vida e a obra de São Josemaria sabe muito bem que a finalidade de tudo o que fazia era essencialmente apostólica. Só lhe interessava aproximar almas a Deus. Portanto, a dimensão estética está subordinada à dimensão pragmática, que é a determinante. Além disso, ele próprio no-lo dizia nas “Notas à 6ª edição portuguesa”:

“Amigo leitor. Escrevi o ‘Santo Rosário’ para que tu e eu saibamos recolher-nos em oração, quando rezamos a Nossa Senhora”.

A finalidade pragmática das cenas do Santo Rosário é pois, evidente. Não obstante, este “fazer com que o receptor faça algo”, tão próprio do discurso pragmático, não tem de se entender como uma “lista de instruções”, nem tão pouco como uma operação para “forçar” o leitor. Há uma série de movimentos dentro e fora das cenas; as personagens falam e atuam, também o emissor e o receptor dizem e fazem, comovem-se e envolvem-se. Contudo, trata-se de movimentos livremente assumidos. São textos abertos; o leitor não tem uma pauta de atuação predeterminada: pode desempenhar qualquer papel dentro do texto e ter o tipo de comportamento que desejar ter. O autor do texto atua como modelo e como exemplo para que o leitor saiba como deve mover-se. É um convite; o receptor pode optar por fechar o livro e não continuar a ler, ou por se comprometer até onde quiser. Em qualquer caso cada receptor empírico tem diante de si infinitas possibilidades de atuação e de contemplação permitidas pelo texto, de tal modo que cada receptor pode atualizar ilimitadas leituras do texto, dentro da verdade do próprio texto e da intenção de comunicação do escritor. Pode inclusivamente ir-se mais longe: a intenção de São Josemaria é a de que o receptor tome a iniciativa e chegue a ser criador, coautor, autor principal do discurso. O leitor, em cada dia, pode deslocar-se pelas cenas; ocupar lugares diferentes; ser a personagem que quiser; acrescentar as pessoas que desejar; adotar as disposições, pensamentos e palavras que a sua imaginação lhe permitir; converter-se em diretor de orquestra de uma polifonia de vozes, dentro do enquadramento e esquema geral proposto pelo texto; trata-se, pois, dum projeto de conversação aberto pensado sobre a base da liberdade plena e ativa do receptor.

3. DISCURSO E CONTEMPLAÇÃO

3.1. A estrutura básica das cenas do Santo Rosário está organizada em torno a dois momentos de comunicação, que correspondem a dois movimentos temporais e a duas intenções do discurso.

Em primeiro lugar, encontramo-nos com uma situação de enunciação empírica real externa: Josemaria Escrivá escreve um texto para um destinatário empírico concreto, cada um dos leitores do livro. Incluída nesta situação de comunicação real, encontramos uma segunda situação de enunciação: a ficção (simulacro) em que se passa a cena que se vai contemplar (p. ex.: a Anunciação, a Visitação, etc.). Nesta segunda instância aparecem uma série de personagens que remetem para pessoas reais: São José, a Virgem, o Menino e também junto com estes, outros dois que remetem para o emissor e receptor empíricos (São Josemaria e o leitor); para além das personagens surgem uns acontecimentos ou virtudes que são para contemplar; e uma série de afetos e de propósitos para o autor e leitor. São, pois, duas situações de enunciação distintas; uma extra-textual e outra interna ao texto.

3.2. A estas duas situações correspondem dois momentos temporais. O primeiro momento não é outro senão o “tempo de leitura”; é um momento dilatado, que abrange os processos de emissão ou de escrita e de recepção por parte do leitor no mundo presente. Como todo o discurso escrito (como uma carta, um jornal, etc.), o tempo de leitura é um tempo diferido: por não estarem presentes simultaneamente no mesmo lugar, emissor e receptor, o tempo abre com um instante de escrita e reinicia-se e encerra-se ao concluir a leitura, com um parêntesis no meio do tempo real, que nos efeitos de leitura é um “tempo zero”. O tempo de leitura é, pois, unitário, e neste caso vincula o autor e o leitor com o mundo “real”. O segundo momento temporal é o “tempo da contemplação”, através do simulacro das cenas, emissor e receptor são projetados para o mesmo instante dos mistérios considerados, junto com as personagens das Sagradas Escrituras: estamos no novo tempo, também real, em que nos relacionamos com os mistérios e as personagens sagradas. O “tempo da contemplação” é um “tempo pleno”, pela profunda densidade do sentido e das vivências para o emissor e para o receptor. A contemplação “fecha-se” quando saímos das cenas e regressamos de novo ao “tempo da leitura”

3.3. Os dois momentos temporais que se acabam de apresentar correspondem a duas intenções do discurso. Por assim dizer; são dois os fins do Santo Rosário, por um lado, a contemplação: viver a vida de Jesus e de Maria; por outro, o apostolado: tentar que o leitor se aproxime de Deus. São as dimensões interna e externa do texto. Durante o “tempo da contemplação” autor e leitor vivem num momento pleno “a vida de Jesus e de Maria”, falam com eles, fixam-se nas suas virtudes, realizam atos (de fé, de esperança, de amor, de contrição), têm afetos (vergonha, amor, ódio, etc.). Ao sair das cenas e do discurso, autor e leitor encontram-se de novo no mundo daqui, na vida que têm de santificar; contudo, as disposições interiores dos sujeitos já não serão exatamente as mesmas que guardavam antes da leitura. Eis o resultado da intencionalidade pragmática deste discurso, o que nos faz perceber de que se publicou para algo.

3.4. Há pois uma correspondência entre momentos de comunicação, tempos do discurso e finalidades do texto. Esta correspondência focaliza a estrutura das cenas.

4. ENQUADRAMENTOS E PERSONAGENS

4.1. Tal como já se disse é preciso arranjar um enquadramento e personagens, tanto no interior como no exterior das cenas. A situação de comunicação “externa” está configurada pelos seres empíricos que estabelecem o diálogo através do texto: São Josemaria e o leitor ou leitores concretos. Autor e leitor têm a sua própria história, os seus contextos: educação, pais, posição social, caráter, virtudes, defeitos, dotes intelectuais, etc. Naturalmente, o texto interatua com todos estes elementos, e funciona de maneira diversa segundo os receptores. Não é indiferente o contexto de cada pessoa, nem a sua situação interior. Se o leitor é cristão, se é homem ou mulher, inteligente ou pouco inteligente, se está triste ou alegre, etc. Naturalmente as variantes são ilimitadas, e não obstante o texto deve funcionar, conseguir um efeito no receptor. Mais ainda, o leitor deve participar no próprio texto. E como se consegue a conexão entre discurso e destinatário? Quanto maior seja a base possível de leitores diferentes, maior deverá ser a competência comunicativa (dom de gentes) do emissor. E mais “aberto” tem de ser o próprio texto. Este é o problema com o que o autor se enfrenta, resolvendo-o com extraordinário acerto.

4.2 A questão fundamental em todo o texto pragmático é a conexão com o receptor. Os textos que são dirigidos a um leitor universal (a maior quantidade de leitores possíveis) necessariamente terão de afinar bastante as estratégias discursivas para alcançar o seu fim. É preciso definir muito bem o “leitor modelo” que vai inscrito no próprio texto, porque de contrário não se chegaria a ninguém. Neste caso, o modelo de leitor configurado pelo próprio texto apresenta traços que facilitam o encontro de autor e de leitor no discurso: entre outras coisas, ambos são um menino e um amigo.

Estes traços estabelecem-se desde o início, na introdução às cenas:

“Meu amigo: se tens desejos de ser grande, faz-te pequeno”.

O amigo identifica-se com o amigo. A amizade iguala, supera as distâncias. Permite a confiança, a confidência. Esta é a chave da proximidade autor-leitor, apesar das diferenças culturais, sociais, econômicas, religiosas, etc. Naturalmente, a amizade não é coisa de palavras, exige fatos. Precisamente, um dos hábitos mais vincados de São Josemaria – tal como foi testemunhado por milhares de pessoas – é a sua capacidade de amar e de fazer amigos. Esta capacidade adivinha-se no texto. O leitor percebe com nitidez através do que está a ler que o autor do livro é digno de confiança e, como consequência, aceita – se quiser – essa amizade. O texto está aberto e exige a colaboração do receptor.

4.3. Por outro lado, tanto emissor como destinatário são crianças. Também esta característica é proposta pelo próprio discurso. Crianças em relação a Deus e aos mistérios sobrenaturais que se vão contemplar. Precisamente, só assim entramos no “tempo de contemplação”: só sendo crianças podemos superar o tempo empírico e unirmo-nos a Cristo num tempo ao mesmo tempo histórico e universal. É que o texto não só une emissor e receptor, une também ambos com Deus, numa dupla perspectiva horizontal e vertical. Trata-se, pois, de um duplo diálogo através do texto.

4.4. Entram neste diálogo outras personagens, tanto da Sagrada Escritura como da vida corrente. Os mais habituais são Jesus, a Virgem Maria, São José e, naturalmente, sempre o autor e o leitor. Cada cena tem também os seus próprios, segundo os relatos dos textos sagrados. Assim, por exemplo: o Anjo São Gabriel, Santa Ana, São Joaquim, Pilatos, os Apóstolos, João Baptista, Simão de Cirene, Barrabás, Maria Madalena, etc.

Naturalmente o leitor pode agregar outras personagens, na medida em que possam ajudar a sua própria contemplação. De novo verificamos que o receptor tem um papel de coautor na atualização do texto, ao poder acrescentar ou introduzir variações no texto base; se não se alterar a finalidade essencial querida pelo autor: se o escritor não é um tirano, o leitor também não o deve ser. O texto estabelece uma espécie de conversa e de contrato sobre uma base de lealdade e de colaboração entre os intervenientes.

Santo Rosário é, evidentemente, um discurso aberto e estrategicamente multidirecional. Há muitos caminhos – cada leitor pode seguir o seu – mas todos acabam, por assim dizer, em Roma. É um livro Cristocêntrico: Jesus é o ponto para onde confluem todos os caminhos propostos pelo discurso.

4.5. O enquadramento das cenas é o âmbito onde se movem as personagens. Neste caso, o enquadramento é materialmente uma reconstrução arqueológica. Já que se trata de “viver a vida” de Jesus e de Maria, é necessária uma atualização, mediante o discurso, dos lugares, tempos e acontecimentos que viveu Cristo. As fontes são, sobretudo, a Sagrada Escritura e a literatura acerca da vida de Cristo. Contudo, é preciso ter em conta que estamos perante um simulacro textual; a reconstrução do enquadramento não tem finalidade histórica: é um instrumento e um dispositivo para a contemplação. Por isso, há uma subordinação de todos os elementos ao projeto de comunicação. Os elementos históricos são submetidos a uma preparação discursiva: a sermocinatio retórica. É necessário propor a contemplação e, em segundo lugar, mover o leitor. Isto exige que o enquadramento seja antes do mais, algo proposto pelo emissor e atualizado pelo leitor. Na reconstrução do enquadramento a imaginação e a cultura do leitor têm muito que ver. O discurso dirige-se ao leitor; dele depende meter-se ou não nas cenas, num sentido criativo e não passivo. Serão suas as emoções, os atos e a contemplação.

Ora bem, durante o tempo da contemplação as personagens estão num tempo pleno; já não estão numa situação histórica contingente. Do mesmo modo, o enquadramento da contemplação não é simplesmente histórico, nem tão pouco um enquadramento criado pelo discurso; encontram-se numa situação nova em que vivem a vida de Jesus e de Maria, realmente. Ao finalizar a contemplação percorrem-se os enquadramentos em sentido inverso:

Enquadramento da contemplação – enquadramento histórico

Enquadramento da cena – enquadramento geral do discurso

Situação empírica do autor e do leitor.

E assim, o autor e o leitor saem da situação de leitura e voltam à vida corrente.

5. MOVIMENTOS DAS PERSONAGENS

5.1 As diversas personagens que povoam as cenas não têm uma atitude passiva: realizam ações e movem-se localmente. Devemos distinguir, portanto, dois tipos de movimento: interno e externo.

5.2. Ao mesmo tempo, autor e leitor, como personagens da cena e pessoas reais, avançam igualmente tanto interna como externamente. O movimento interno – a conversão – é precisamente a finalidade do discurso.

6. ANÁLISE DE “A ANUNCIAÇÃO”

6.1. Em primeiro lugar, vamos analisar um Mistério Gozoso: “A Anunciação”. A brevidade das cenas facilita um estudo pormenorizado.

“Não te esqueças, meu amigo, de que somos crianças. A Senhora do doce nome, Maria, está recolhida em oração.

Tu és, naquela casa, o que quiseres ser: um amigo, um criado, um curioso, um vizinho... - Eu por agora não me atrevo a ser nada. Escondo-me atrás de ti e, pasmado, contemplo a cena.

O Arcanjo comunica a sua mensagem... - Quomodo fiet istud, quoniam virum non cognosco? - Como se fará isso, se não conheço varão? (Lc 1, 34).

A voz da nossa Mãe traz à minha memória, por contraste, todas as impurezas dos homens..., as minhas também.

E como odeio então essas baixas misérias da terra!... Que propósitos!

Fiat mihi secundum verbum tuum. - Faça-se em mim segundo a tua palavra (Lc 1, 38). Ao encanto destas palavras virginais, o Verbo se fez carne.


Vai terminar a primeira dezena... Ainda tenho tempo de dizer ao meu Deus, antes que nenhum mortal: Jesus, eu Te amo”.

Nas frases do texto alternam-se as referências ao mistério que se considera e as indicações relativas às atitudes do emissor e do receptor. De maneira que, à medida que o mistério avança, emissor e receptor vão progredindo no conhecimento e amor a Cristo.

6.2 A primeira sequência do texto é uma instrução dirigida ao receptor para lhe fazer saber qual é o leitor modelo do discurso, ou o que vem a ser o mesmo: qual é a chave de leitura do livro:

“Não esqueças, meu amigo, que somos crianças”.

A disposição ideal que se requer para a atualização do discurso é “fazer-se criança”. Isto não é novo no cristianismo: Jesus exigia-o aos seus discípulos, de modo que não pode surpreender-nos. O que talvez sim seja novo é que esta característica seja utilizada fazendo parte da “competência linguística” necessária para poder interpretar um texto.

6.3. Depois da instrução ao leitor, começa propriamente a cena:

“A Senhora do doce nome, Maria, está recolhida em oração”.

Naturalmente, ao chegar a este ponto tem a palavra o leitor. Cada um atualizará ao seu modo a sequência. A cooperação para interpretar é livre e quase ilimitada. O rosto, as mãos, as vestes, as posições, a atitude, etc. tem de criá-las o leitor. Pensemos nos diferentes quadros realizados pelos pintores sobre o tema da Anunciação. Os pintores foram recriando diversos momentos da cena, seguindo os relatos de S. Lucas. Do mesmo modo, foram variando os motivos e os objetos, assim como a presença ou ausência das frases enunciadas pelas personagens (o Anjo, a Virgem, a Trindade). O leitor sem dúvida alguma fará o mesmo, sem dúvida alguma, segundo a sua própria cultura, intuição, devoção, gosto artístico, imaginação, etc.

6.4. Prossegue o texto com uma nova instrução ao leitor:

“Tu és, naquela casa, o que quiseres ser: um amigo, um criado, um curioso, um vizinho…”.

A função é clara: fazer saber ao leitor que tem de entrar “naquela casa”, quer dizer, não só no texto e na cena, mas também na realidade representada: o leitor tem de ser uma personagem, e são sugeridos a ele possíveis papéis: um amigo, um criado, etc. Em qualquer caso, o leitor passa a fazer parte da cena. A reação do receptor pode ser de surpresa: a instrução é inesperada e talvez não saiba o papel que deve assumir; talvez não se atreva a ser nada. Contudo, o próprio texto considera e tem em conta esta possibilidade, e evita o problema:

“Eu, por agora, não me atrevo a ser nada. Escondo-me atrás de ti e, pasmado, contemplo a cena”.

O autor não se atreve a ser nada; deste modo não interfere na estratégia incipiente do leitor, nem lhe retira o protagonismo. Mas introdu-lo no discurso duma maneira indireta: ao situar-se por trás do leitor na contemplação do mistério, o receptor não tem mais opção do que considerar-se incluído ele próprio. Claro está que poderá repudiar esta inclusão e não continuar a ler, mas então não terá acesso ao resto do mistério nem o poderá viver. Talvez o anime a presença do autor, situado a um lado como um amigo. Em qualquer caso a cena continua com Maria e o Anjo.

6.5. A sequência seguinte abre um período novo na contemplação, porque aparece uma nova personagem. E estamos a chamar “cenas” aos “mistérios”, mas na realidade cada mistério é um conjunto de cenas, em sentido próprio. Com efeito, do mesmo modo que no teatro ou no cinema, o discurso em imagens se divide em cenas, conforme a entrada ou saída das personagens. Sempre que entra ou sai uma personagem nova, inicia-se uma nova cena sem que se perca a unidade da contemplação, nem a unidade do discurso. Da mesma maneira, quando as personagens conversam, há mudanças de ordem na utilização da palavra: tem-se ou cede-se a vez, o direito de falar. Estas mudanças de ordem, que são movimentos de conversação, permitem uma nova subdivisão das cenas em unidades mais simples, a que chamamos estampas, para indicar a sua natureza idealmente audiovisual. A estampa seria a unidade de expressão de um ou de mais falantes numa ordem de conversação dentro da cena.

Inclui, portanto, não só as palavras ditas, mas também os falantes, os códigos, os contextos, a música e o cenário. Neste caso, como dizia, abre-se uma nova cena com a aparição do Anjo:

“O Arcanjo comunica a sua mensagem…”

Contudo, São Josemaria não cita textualmente as palavras do Anjo: sugere-as somente. Isto supõe um leitor necessariamente cristão ou que conheça o texto de Lucas, dado que a mensagem do Anjo é fundamental. A razão disto só pode ser esta: São Josemaria focou a contemplação na Virgem; as restantes personagens e os seus discursos ficam desfocados. Tudo está em função da Virgem e nas suas respostas.

“Quomodo fiet istud, quoniam virum non cognosco? – Como se fará isso, se não conheço varão?”.

As palavras da Virgem manifestam-se como sendo reais dentro da cena; não são uma citação textual ou uma frase histórica, são uma realização no “tempo da contemplação” e não uma simples “imaginação”. Podemos viver a vida de Jesus e de Maria e falar verdadeiramente com eles, não são imaginações: executam-se atos que ultrapassam o próprio texto e as suas ficções. De fato, o previsto pela própria estratégia do discurso é que o emissor e receptor reajam realmente ante as palavras e ações dos mistérios, e uma reação que comprometa pessoalmente.

6.6. Eis aqui a reação:

“A voz da nossa Mãe traz à minha memória, por contraste, todas as impurezas dos homens…, as minhas também. E como odeio então essas baixas misérias da terra!... Que propósitos!”.

São pensamentos – e ações – do “autor implícito” no texto; que ao mesmo tempo é uma personagem mais da cena, junto com o leitor-personagem; e que tem correspondência com o “autor empírico” na vida real. Não se trata, obviamente, de três pessoas distintas, mas de três instâncias semióticas diferentes do texto; três funções diferentes, que neste caso, convergem ideal ou intencionalmente. Mas voltemos à reação. Há uma comparação explícita entre a vida e virtudes de Maria e as do autor do livro (e personagem na cena). Fruto dessa comparação sucedem-se uns movimentos internos no autor-personagem. Concretamente, duas paixões: a vergonha e o ódio ao pecado; e uns propósitos, que o autor não explicita, mas que logicamente serão de emenda. As paixões referem-se ao presente; os propósitos, ao futuro.

A vergonha é, segundo Aristóteles (Retórica, 1383b 15), “uma pena e perturbação acerca dos vícios presentes, passados ou futuros que levam a perder a honra”. A vergonha sente-se perante alguém, talvez ante a Virgem. À vergonha sucede outra paixão: o ódio ao pecado. E ao ódio sucedem os propósitos: decisões da vontade. Há pois, um movimento interno na pessoa como fruto da contemplação. Um movimento interno que afeta a conduta posterior, fora da contemplação e do tempo de leitura: uma mudança na vida real. Mas não só no autor; também no leitor. O leitor segue o autor; é também uma personagem da cena e é afetado pela mesma estratégia do discurso. Do mesmo modo que conhece as paixões e impurezas dos homens pode sentir vergonha ao comparar a sua própria vida com a pureza da Virgem, odiar o pecado e mudar de vida. Neste sentido, o exemplo do amigo é uma ajuda, e um modelo de atuação tal como é sugerido pelo discurso. Não obstante, trata-se duma decisão pessoal.

6.7. A sequência seguinte inicia uma nova estampa: A Senhora dá o seu consentimento:

“Fiat mihi secundum verbum tuum. – Faça-se em mim segundo a tua palavra”.

Ao produzir-se “uma mudança de ordem” na conversação, abre-se um nova estampa. Contempla-se agora o consentimento da Virgem. O narrador faz-nos saber as consequências do “sim” de Maria.

“Ao encanto destas palavras virginais, O Verbo se fez carne”.

Naturalmente, o narrador segue o texto de São Lucas; mas o estilo da voz do narrador é o de São Josemaria. Portanto, não há apenas um autor-personagem, uma criança-amiga na cena; há também que contar com uma voz que dirige a narração: um narrador omnisciente. Só um narrador deste tipo pode relatar este mistério: o Verbo faz-se homem; algo assim não pode ser entendido pelas crianças que assistem à cena; inclusivamente este mesmo fato se oferece à contemplação das crianças mas de fora.

6.8. Com a aparição de uma nova personagem no enquadramento – o Verbo, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade –, em boa lógica é necessário abrir uma nova cena (porque definimos as cenas precisamente pela entrada e saída das pessoas). A partir de agora, no diálogo com todos, está também o próprio Jesus Cristo. Assim a contemplação, atinge o ponto culminante do ponto de vista objetivo, por ser Cristo o objetivo mais excelente de contemplação. Também o discurso cumpre a sua plena finalidade: o leitor é levado intencionalmente ao encontro com Cristo, pelo menos, dentro do texto.

A presença do Verbo no discurso abre, pois, novas possibilidades de relação com outras personagens; especialmente, se há a suficiente audácia, com o autor e com o leitor. Contudo, como assinalamos repetidas vezes, o texto está aberto, sugere mas não impõe. Depende do leitor atualizar ou não os convites e sugestões do discurso: o leitor pode optar neste caso, por uma aproximação a Jesus, por uma contemplação silenciosa, por uma invocação ao Redentor, ou simplesmente, por nada. O mais provável é que se surpreenda e não saiba o que fazer. Talvez necessite de uma ajuda. O autor do texto prevê esta contingência.

6.9. O último parágrafo do mistério é especialmente relevante, e encerra múltiplas funções significativas:

“Vai terminar a primeira dezena… Ainda tenho tempo de dizer ao meu Deus, antes que nenhum mortal: Jesus, eu Te amo”.

Talvez o mais significativo deste parágrafo seja a sua função de ponte entre a dimensão interna do texto e a externa. Isto é, da ligação entre contemplação e vida real.

Em primeiro lugar, a sequência “vai terminar a primeira dezena… introduz uma deixis temporal: marca um momento dentro de um processo. Mas, além disso, é uma deixis locativa: situa-nos num “de onde” com relação ao discurso e à vida. Com efeito, a contemplação da cena prolongou-se durante a recitação de uma dezena de Ave Marias; isto é uma precisão temporal. Mas simultaneamente, a “contabilidade do Terço retira-nos do texto e conduz-nos à realidade empírica, ao contexto e à situação; não só temos que estar dentro das cenas, os pés têm de pisar o chão e não perder de vista o que nos rodeia. A frase tira-nos do texto, mas ao mesmo tempo marca a continuidade – porque é ponte – entre “contemplação no discurso” e a “vida fora do discurso”. Mais ainda: projeta a contemplação fora do discurso, em direção à vida empírica. Não há uma ruptura entre o que se contemplou e a vida prática. Encontramos a confirmação em que regressamos de novo ao mistério:

Ainda tenho tempo de dizer ao meu Deus, antes que nenhum mortal: Jesus, eu Te amo”.

Há uma rápida saída do texto para tomar consciência do tempo: passamos da eternidade da contemplação, à contingência do humano; para regressar rapidamente à contemplação e dizer um ato de amor; e sair definitivamente do discurso. É uma oscilação, um cintilar da câmera; do operador que é “cênico” e prospectivo, para voltar a ser cênico, e acabar.

Contudo, deixa-se um tempo para o leitor, por sua vez, poder fazer um ato de amor. O texto diz: “antes que nenhum mortal”; depois, há depois “outros”. Porque, na realidade, o que encerra a contemplação não é o autor, mas o leitor. Também o receptor tem “parte” na construção do texto. E saímos do discurso.

6.10. Se compararmos o relato de São Lucas com o texto de São Josemaria Escrivá que estamos a analisar, há diferenças enquanto à estruturação do discurso. O texto evangélico é essencialmente narrativo, e não um “discurso em imagens”. Não obstante se procedêssemos a uma “partição em cenas”, o número de estampas seria maior. Concretamente, 14.

A distribuição ficaria da seguinte maneira:

1. O Anjo é enviado por Deus a Maria, desposada com José (a ação decorre “no Céu”, antes da Anunciação).

2. O Anjo entra na presença da Virgem.

3. O Anjo saúda a Virgem.

4. Maria perturba-se ante a saudação do Anjo.

5. Maria considera o significado da saudação.

6. O Anjo tranquiliza a Virgem: Ne timeas.

7. O Anjo comunica os planos de Deus sobre ela: “conceberás no seio e darás à luz um Filho.”

8. O Anjo anuncia o plano salvador de Jesus: será chamado Filho do Altíssimo e reinará eternamente.

9. Maria pergunta o modo como se fará isso, porque é virgem.

10. O Anjo responde: será obra do Espírito Santo.

11. S. Gabriel anuncia a gravidez de Isabel na sua velhice. É uma boa prova da veracidade da embaixada: para Deus não há impossíveis.

12. Maria aceita: Fiat.

13. O Anjo retira-se.

14. A Virgem concebeu.

Como referiu em certa ocasião o semiólogo Cesare Segre, todos os quadros e representações feitas a propósito do texto por numerosos pintores de todos os tempos, podem-se considerar como reproduções de uma ou de várias das 14 estampas referidas.

São Josemaria centra-se exclusivamente nos discursos da Virgem, e recolhe só as estampas nº 2, 7, 9, 12 e 14. Há uma seleção e uma simplificação evidentes.

7. ANÁLISE DE “A VISITAÇÃO”

7.1. Enquanto que o texto da “Anunciação” apresenta um mistério estático, “a Visitação” é, em contrapartida, um mistério dinâmico. Com efeito, as diversas estampas da Encarnação decorrem num enquadramento fechado, no quarto onde se encontrava a Virgem. Tudo convida ao recolhimento, e as personagens permanecem imóveis: não se deslocam no enquadramento, nem mudam de enquadramento. Pelo contrário, na Visitação há um “movimento local” das personagens, uma peregrinação e uma contemplação itinerante; além da mudança de enquadramento de ação e de contemplação.

São dois os enquadramentos nos quais se desenvolve a ação do mistério. O primeiro é dinâmico: é o âmbito geográfico que rodeia uma peregrinação a uma aldeia da tribo de Judá onde vive Isabel. Contemplamos Maria e José caminhando; acompanhamos a sua mudança. O enquadramento move-se na paisagem externa (lugares, aldeias, gentes, tempo atmosférico, vicissitudes do caminho, alimentos, fadigas, etc.). E com a paisagem interna (afetos das personagens, anseios, recordações de família, diálogos, virtudes, etc.). O segundo enquadramento é estático; a ação decorre na casa de Isabel e Zacarias, onde trocam confidências as duas mulheres. Especialmente Isabel. Naturalmente, tem de se ter em conta também o enquadramento real do autor e do leitor, na vida diária, que é onde se projetam as ações.

7.2. Os dois momentos da contemplação correspondentes aos dois enquadramentos, um estático e outro dinâmico, repartem as cenas, as estampas que se tem de considerar.

O momento dinâmico constitui uma peregrinação à casa de Isabel. Autor e leitor assistem a uma peregrinação itinerante. Os Evangelhos não nos dizem nada sobre a viagem, de modo que esses silêncios têm que os preencher autor e leitor. Josemaria Escrivá situa José junto a Maria; este fato, além da sua verossimilhança histórica, tem a virtualidade narrativa de multiplicar as possibilidades de ação e relação entre personagens: permite a existência de diálogos, confidências, narrações indiretas de acontecimentos através dos diálogos entre José e Maria, afetos, manifestação de virtudes e caracteres, etc. A consequência ascética evidente de tudo isto é a ampliação do panorama global da contemplação, e a abertura de relações reais de oração e diálogo entre José e Maria, autor e leitor. Fazemos finca-pé de novo em que a finalidade do texto é precisamente o diálogo real dos leitores com José e Maria: não são simples imaginações, mas uma verdadeira contemplação. De fato algumas dessas possibilidades narrativas, abertas pela presença de José, veem-se materializadas explicitamente no próprio texto. Isto é:

“Ouvirás falar de Isabel e de Zacarias, enternecer-te-ás com o amor puríssimo de José, e baterá fortemente o teu coração cada vez que pronunciarem o nome do Menino que nascerá em Belém...”

Todos estes pontos de meditação são devidos, narrativamente falando, à presença de José no discurso: o seu diálogo com Maria, as suas virtudes em relação a ela, etc.

O momento estático sucede em casa de Isabel. As duas mulheres, trocam as suas confidências. Este momento tem notáveis paralelismos com o mistério gozoso da Anunciação:

1. Os dois mistérios têm como enquadramento um âmbito fechado, um quarto.

2. Os dois mistérios apresentam uma estrutura dialogada, com alternâncias no uso da palavra (diálogo com o Anjo num, com Isabel no outro).

3. Os dois textos têm como centro a revelação da maternidade divina da Virgem.

4. Os dois textos fazem referência explícita à maternidade das duas mulheres e à concepção dos dois meninos (Jesus e o Baptista).

5. Os dois textos apresentam uma incidência nos diálogos: apenas se citam as palavras textuais de uma das personagens; da outra só sabemos o que o narrador nos conta. Isto quer dizer que a contemplação recai principalmente sobre uma das personagens. Na Anunciação o diálogo está focado em Maria, enquanto que na Visitação o está em Isabel.

7.3. No que respeita às personagens, o seu número varia segundo o momento da contemplação (estático e dinâmico).

No momento dinâmico:

–Autor e leitor ‚ José Diretamente (atuando)

–Maria ‚ Isabel ∙ Zacarias Indiretamente (através do diálogo)

–Jesus, Menino

No momento estático:

–Autor e leitor

–João, o Batista Diretamente (atuando)

–Maria‚ Isabel‚ Zacarias Indiretamente (em lugar à parte)

–José

Não há uma presença confirmada das personagens ao longo de todo mistério. Encontram-se distribuídos segundo os enquadramentos.

Autor e leitor são personagens privilegiadas. Têm oportunidade de ver tudo: são testemunhas de exceção por autorização que todos respeitam e por privilégios e estratégias do discurso. Autor e leitor são simultaneamente autores e produto do próprio discurso.

São autores do texto enquanto dirigem as suas estratégias e selecionam as possíveis vias de desenvolvimento. São produtos do texto porque a sua presença e privilégios só se justificam no discurso, e porque o seu papel é dependente do texto. Há, pois, um processo de retroalimentação entre o texto e os utilizadores; entre ficção e realidade; entre discurso e vida. Começa-se por um pacto de leitura, mas acaba-se na vida real; natural e sobrenatural. Começa-se num mundo semântico e num universo de discurso, mas acaba-se superando a barreira do simplesmente semântico.

7.4 Entre os paralelismos que se apreciam no mistério há que assinalar especialmente dois: A Virgem visita Isabel e Isabel anuncia a maternidade divina da Virgem; Jesus (no ventre da sua Mãe) visita o Baptista e o Baptista anuncia com o seu salto à presença do Salvador.

Estes paralelismos tinham-se iniciado no mistério anterior (a Anunciação). É o Anjo quem relaciona explicitamente a maternidade de Isabel com a maternidade de Maria, e a concepção miraculosa de João o Baptista com a concepção virginal de Jesus.

7.5 Passamos a analisar o mistério da Visitação, sequência a sequência.

“Agora, meu pequeno amigo, espero que já saibas mexer-te. - Acompanha alegremente José e Santa Maria... e escutarás tradições da Casa de Davi.

Ouvirás falar de Isabel e de Zacarias, enternecer-te-ás com o amor puríssimo de José, e baterá fortemente o teu coração cada vez que pronunciarem o nome do Menino que nascerá em Belém...

Caminhamos apressadamente em direção às montanhas, até uma aldeia da tribo de Judá (Lc 1, 39).

Chegamos. - É a casa onde vai nascer João Batista. - Isabel aclama, agradecida, a Mãe do seu Redentor: Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre! A que devo tamanho bem, que venha visitar-me a Mãe do meu Senhor? (Lc 1, 42-43).


O Batista, ainda por nascer, estremece... (Lc 1, 41). - A humildade de Maria derrama-se no Magnificat... - E tu e eu, que somos - que éramos - uns soberbos, prometemos ser humildes.

O texto começa por recordar ao receptor as chaves para a contemplação: “Agora, meu pequeno amigo, espero que já saibas mexer-te”. Com esta simples instrução se estabelece o “leitor modelo” do discurso: um menino (capaz de crer, esperar e amar) e um amigo (capaz de identificar-se com o autor-amigo). A referência ao receptor tem como finalidade recordar-lhe o seu papel ativo dentro do discurso e a contemplação. Só encarnando o “leitor modelo ideal” se alcança plenamente o sentido do texto, que leva a uma realidade externa ao texto. Naturalmente, o leitor pode seguir ou não a instrução; mas, só acreditando no narrador pode o leitor aceder ao mistério.

7.6. Os afetos são muito importantes na contemplação proposta pelo autor. Não só há instruções relativas aos elementos mais racionais ou verossímeis do mistério; há, no entanto, indicações explícitas aos afetos do leitor. Certos afetos devem acompanhar certas ações. Além de uma “textura” das ideias e dos conteúdos, há uma “textura” dos afetos, que conforma o discurso. Não é em vão que um texto é apenas um “tecido” com fios bem determinados e precisos, combinados de certa maneira. Os sentimentos que acompanham as ideias e ações são muito importantes para a recepção, pois, como refere Aristóteles na Retórica (1378 a1), “ninguém julga da mesma maneira, sobre as mesmas cosas, amando ou odiando”. Nem as ações se realizam da mesma maneira com gosto ou com repugnância. Dado que a verdade prática é o “apetite recto”, convém que as boas ações acompanhem emoções positivas, e não o contrário.

Precisamente por isto, o autor sugere também afetos, talvez os que resultem da sua própria contemplação:

“Acompanha alegremente José e Santa Maria… e escutarás tradições da Casa de David”.

A indicação precisa do afeto, é altamente significativa: 1) contribui para a conformação do leitor modelo: 2) refere o modo em que deve atualizar-se o discurso; 3) indica a emoção que corresponde a essa fase da contemplação (à viagem com José e Maria) que estamos a considerar. Em primeiro lugar, o leitor modelo é um menino que ama José e Maria; a possibilidade de viajar com estas santas personagens é um autêntico privilégio: por isso a alegria. Contudo, é preciso atualizar a alegria; o leitor deve contar com esta instrução precisa para saber que pode e deve manifestar-se com naturalidade, que não deve ocultar os seus sentimentos. Em segundo lugar, o próprio discurso exige a proporção entre afetos e conteúdos: numa viagem prolongada no tempo em que deve haver diálogo e apoio mútuo entre os viajantes e, consequentemente, alegria se se vai em boa companhia. Finalmente, convém à própria contemplação experimentar alegria ao tratar a Sagrada Família, pois a alegria é efeito natural da contemplação e da participação no bem.

Como também já se disse, não há uma única referência afetiva, mas uma série organizada de indicações sentimentais; não contando com as descrições de hábitos e de ações. A relação da série afetiva da cena da Visitação é a que se segue:

1. Agora meu pequeno amigo, espero que já saibas mexer-te.

2. Acompanha alegremente, José e Santa Maria.

3. Enternecer-te-ás com o amor puríssimo de José.

4. Baterá fortemente o teu coração.

5. Isabel aclama, agradecida, a Mãe do seu Redentor.

6. Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre.

7. O Batista, ainda por nascer, estremece

8. A humildade de Maria derrama-se no Magnificat.

9. E tu e eu, que somos – que éramos – uns soberbos, prometemos ser humildes.

O enunciado inclui os movimentos afetivos (explícitos e implícitos) em relação com os fatos que se contemplam. Portanto, certos acontecimentos vão sistematicamente acompanhados por determinadas emoções. Sem dúvida, se se observa a lista de fatos e emoções, verifica-se que contém a totalidade prática das ações e descrições do mistério. Portanto, trata-se dum fenômeno sistemático.

A pergunta que interessa fazer agora é se há uma certa ordem nestas emoções. Há algum elemento que permita relacioná-las todas? Ou, é uma simples soma de emoções? Ou, pelo contrário, existe uma hierarquia e um ponto comum entre todas elas?

Parece claro que não se trata de uma simples acumulação de emoções, porque todas elas estão orientadas em torno da ideia de alegria. Com efeito, trata-se de uma rede de afetos distribuída ao longo do texto: “menino amigo”, “enternecerás”, “amor puríssimo”, “baterá com mais força (o teu coração)”, “agradecida”, “bendita”, “bendito”, “estremece”, “gozo”, “humildade”, “humildes”. A rede está constituída por uma série de termos que conferem uma tonalidade afetiva muito positiva para a contemplação. São elementos de animação; todos eles reforçam a ideia e a emoção de alegria. Estamos ante o que a semiótica de Greimas denomina uma “isotopia”: quer dizer, uma relação interconectada de termos pertencentes a um mesmo campo semântico, e que reforça uma mesma ideia de base.

Torna-se necessário mostrar que se trata efetivamente de termos que conectam e se relacionam com a ideia de alegria:

(1) Pequeno amigo: a amizade supõe uma participação conjunta de duas ou mais pessoas no bem; o que produz alegria. Aristóteles refere a este respeito que a amizade é uma das “partes” da felicidade (Retórica, 1360b 20).

(2) Enternecer-te-ás com o amor puríssimo: a ternura é uma certa suavidade de ânimo perante a contemplação do bem e da beleza, que gera alegria. Opõe-se ao violento, e neste sentido é um regresso e reconhecimento da natureza.

(3). Amor puríssimo: é evidente que a contemplação do amor gera alegria. Mais, se for puríssimo.

(4) Baterá fortemente o teu coração: sintoma do amor. Precisamente é o gozo ante o amor que causa os batimentos.

(5) Aclama agradecida: agradecem-se os favores; o favor é uma espécie de bem; onde há bem há alegria. Se há expressões de júbilo e louvor, isto é sinal de que a alegria é grande; ou porque o bem é grande ou por ter sido muito desejado.

(6) Bendita és tu e bendito o fruto: são as expressões do bem que motiva a alegria. Quer dizer, o bem que se celebra é duplo: a maternidade de Maria, que se converte na Mãe do Salvador, a presença do próprio Salvador, no ventre de Maria. Todo o louvor tem como objeto ou motivo uma virtude ou qualidade positiva que se celebra, e, simultaneamente, é expressão da alegria que esta qualidade provoca. Dado que os bens são imensos neste caso, a alegria também o é. Inclusivamente para os leitores que contemplam as cenas (se realmente entram no mistério).

(7) O Baptista estremece, a Sagrada Escritura especifica que o Menino salta de gozo no seio de Isabel. O motivo da alegria é a presença de Jesus; o precursor anuncia desta maneira o Cristo. Este gozo ante um bem tão intenso deve atingir os leitores, que se contagiam com a alegria de Maria, de Isabel e do Baptista.

(8) A humildade de Maria derrama-se no Magnificat. E não só a humildade: o Magnificat é expressão de um gozo inefável. A alegria de Maria ante o maior bem que pode recair numa criatura: ser a Mãe de Deus. E sobretudo toda a alegria ante as grandezas do Senhor. Assim o diz o texto do Cântico, embora não apareça textualmente citado na cena: “A minha alma proclama as grandezas do Senhor e alegra-se o meu espírito em Deus meu Salvador” (Lc 1, 48).

(9) Prometemos que seremos humildes. Certamente, a humildade não é um afeto, mas uma virtude. Mas a certas virtudes correspondem naturalmente certos afetos. A humildade não é uma virtude triste; é de fato uma virtude, é um bem, e como tal produz alegria. Esta é, por outra parte, a convicção pessoal de São Josemaria, e também a experiência multissecular da Igreja. Além disso, neste caso trata-se de uma conversão: autor e leitor, segundo o texto, eram uns soberbos, mas agora prometem ser humildes. Há um crescimento moral, um passo do mal (soberba) para o bem (humildade), e toda a conversão é gozosa; precisamente porque se atinge o bem. O próprio Magnificat é um exemplo de humildade e de alegria.

Em conclusão: resulta claro em face do exposto que existe no texto uma rede de termos afetivos; que se trata de uma isotopia de emoções hierarquizadas em torno da ideia de alegria, porque todos os afetos são partes ou espécies de alegria; e as referidas emoções têm uma relação direta, concomitante, com as realidades sobrenaturais que se contemplam.

7.7. O segundo parágrafo do mistério é constituído por uma série de instruções ao leitor, referidas ao conteúdo da contemplação; é um programa sugerido ao leitor:

“Ouvirás falar de Isabel e de Zacarias, enternecer-te-ás com o amor puríssimo de José, e baterá fortemente o teu coração cada vez que pronunciarem o nome do Menino que nascerá em Belém…”

É uma sucessão de estampas, clarões de um flash, apresentadas indiretamente por um narrador. Não propriamente uma narração, porque esta sucessão de estampas não constitui uma fábula ou uma história. É uma combinação de imagem mais palavra, na qual a palavra não é mais do que uma apresentação deíctica de uma imagem que prevalece semioticamente; na realidade, o gênero mais próximo desta situação, do ponto de vista técnico, é a banda desenhada. Com efeito, independentemente da temática, encontramo-nos aqui ante uma série de vinhetas com um leve apoio verbal, como sucede na banda desenhada. Contudo, e aqui reside a novidade, as imagens têm de ser construídas idealmente pelo próprio leitor, que as contemplará. E, não obstante, as imagens hão de ser o fundamental, e as palavras apenas um guia. De modo que as palavras são colocadas pelo autor e as imagens pelo leitor. Trata-se, pois, dum texto aberto, recebido em cooperação.

Assim, pois, as palavras do autor são uma sequência de instruções dadas ao leitor para a construção do texto. Isto manifesta-se linguisticamente assim. São indicações expressas com os verbos no futuro: ouvirás, enternecer-te-ás, baterá, etc. São fatos que se supõem futuros, mas que certamente o leitor terá que ir atualizado; porque de outro modo não acontecerão de outra maneira. Quer dizer, os verbos estão no futuro não só porque as ações se vão produzir no futuro, mas principalmente porque são instruções, que o leitor terá que cumprir.

7.8. A sequência seguinte introduz o primeiro enquadramento da contemplação da cena. Aí se desenvolve, de um modo itinerante, o programa contemplativo anteriormente citado:

“Caminhamos, apressadamente em direção às montanhas, até uma aldeia da tribo de Judá”

É interessante notar que, assim como “enquadramento” e “história” são duas funções do discurso distintas conceptualmente – embora não separáveis – assim foram apresentadas independentemente no texto. No segundo parágrafo, o autor sugeriu-nos um programa de contemplação; no terceiro, apresenta-nos o enquadramento – o lugar – onde se desenvolverão os acontecimentos e a própria contemplação.

Como se indicou já, neste enquadramento desenrola-se tanto o programa contemplativo, como os movimentos internos e externos das personagens. Os movimentos internos compreendem os afetos, ideias e virtudes das personagens; os externos, o peregrinar físico até à casa de Isabel. Há um paralelismo, precisamente, entre movimentos internos e externos. Ambos são uma aproximação religiosa dirigida para a vontade providente do Pai. Maria – e nós com ela – segue o caminho que o Anjo lhe assinalou: visita a sua prima, pois, segundo lhe revelou, encontra-se grávida; nós, por sua vez, acompanhamos a Virgem, pois foi-nos revelado que uma Virgem conceberá um Menino, que será o Salvador. Tanto Maria como nós procuramos o Senhor num enquadramento em movimento, tanto interno como externo.

7.9 A contemplação desenrola-se num enquadramento em movimento. Há um sinal para a abertura do enquadramento e outro para o seu fecho. O fecho do enquadramento surpreende-nos em plena contemplação:

“chegamos”.

A expressão “chegamos” é simultaneamente o final do movimento e a marca discursiva do final do primeiro enquadramento. Não obstante, a contemplação não cessa, porque se abre logo um enquadramento novo: um enquadramento fixo, neste caso.

“É a casa onde vai nascer João Batista”.

De momento não há história: é somente a apresentação de um novo enquadramento: A função textual “enquadramento da história” tem correlação linguística no discurso.

7.10. O texto de São Josemaria não refere muitos elementos propriamente narrativos dos evangelhos. É evidente que segue o relato de Lucas, mas não como narração, mas só como fonte. Só assim se explicam saltos de informação que o autor supõe serem conhecidos do leitor. Isto é explicado pela finalidade do discurso do Santo Rosário: não é um texto narrativo, mas um artefato semiótico, com uma sucessão de sequências a contemplar. Neste sentido, há um eclipse de elementos narrativos, relativamente ao texto de Lucas, e uma proliferação de pormenores – uma amplificação – para considerar. Do ponto de vista da mimesis, há no Santo Rosário uma deslocação do narrativo para o representativo (cfr. Aristóteles, Poética, 1448 a 20ss).

A sequência seguinte tem em conta precisamente um desses saltos narrativos:

“Isabel aclama, agradecida, a Mãe do seu Redentor: Bendita és tu…”.

A sequência anterior a esta indicava apenas a chegada à casa do Baptista. Agora, no instante, aparecem reunidas Maria e Isabel com louvores a Maria por parte da prima. Do ponto de vista narrativo e de lógica da ação é evidente que algo falta; por exemplo, a entrada na casa, a saudação dos moradores, a entrada no quarto, o começo da conversa entre as primas. Consultemos o relato de Lucas e vejamos as diferenças: “Por aqueles dias, Maria levantou-se e foi com pressa às montanhas, a uma cidade de Judá; e entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel. E quando ouviu Isabel a saudação de Maria, o menino saltou no seio, e Isabel ficou cheia do Espírito Santo; e, exclamando em voz alta, disse: – Bendita és tu entre todas as mulheres …” (Lc 11, 39-43).

No evangelho: 1) há uma referência explícita à entrada de Maria na casa; 2) há menção do fato de Maria ter saudado Isabel; 3) narram-se os efeitos da saudação de Maria no Baptista e em Isabel; 4) louvores de Isabel à Virgem Maria. Pelo contrário, no texto do Santo Rosário eliminam-se: 1) a entrada de Maria na casa; 2) a saudação da Virgem; 3) os efeitos da saudação em Isabel e no Baptista, que são contemplados – mas não relatados – mais adiante. Suprimem-se, pois, os elementos narrativos, e são substituídos pelas sequências representativas. Isto supõe uma sermocinatio, uma reelaboração do texto evangélico, de modo que o narrativo e histórico passe a ser representativo (quase pictórico) e universal.

7.11. Teologicamente, a maternidade de Maria é a causa de todos os dons, humanos e sobrenaturais, da Virgem. Também é a causa dos elogios e louvores que recebe da sua prima. Tecnicamente, já que autor e leitor estão presentes na cena, as palavras das personagens adquirem uma nova dimensão e sentido novo. A razão é esta: Isabel fala com Maria, mas indiretamente – in obliquo – dirige-se também a nós, no texto do Santo Rosário: durante o tempo de leitura e o tempo de contemplação. O acesso aos mistérios que se contemplarão só é possível através do diálogo das personagens ou mediante a revelação do narrador. Por isso São Josemaria como autor utilizará necessariamente estes dois procedimentos para comunicar a informação de que precisam os leitores: o diálogo das personagens, como no teatro, vai dirigido também ao receptor, inclusivamente, embora se encontre fora da cena. No caso presente, o leitor está dentro da cena, como uma personagem mais; diante de Maria e de Isabel que atuam diretamente, com impressão de realidade.

Isto significa que as palavras das personagens adquirem um sentido novo que não está presente no relato evangélico, pelo menos como “modo de dizer” (modus dicendi). Assim as palavras de Isabel – “A que devo eu tamanho bem, que venha visitar-me a Mãe do meu Senhor” (17-20) – não só exprimem um fato histórico, o texto de um diálogo; mas também, do ponto de vista textual, oferecem aos leitores um novo ponto de contemplação: a maternidade divina de Maria como fonte de todo o bem para os cristãos.

7.12. O último parágrafo da cena pressupõe uma mudança de focagem. A atenção até este momento estava centrada nas palavras de Isabel; agora, pelo contrário, produz-se uma narração em estampas caracterizada pela alternância de personagens. Dentro do mesmo enquadramento estático, isto é, do quarto onde se encontram Isabel e Maria, acontece uma mudança de “operador”, um movimento de câmera que procura sucessivamente o resto das personagens do quarto: João Baptista, Maria, autor e leitor implícitos. Assim, pois, podemos distinguir dois “momentos” lógicos dentro do enquadramento do quarto: 1) um primeiro, como um operador cênico fixo, que recolhe a conversa das duas mulheres; 2) um segundo, como um operador prospéctico em movimento que gira focando as outras personagens do quarto. Ambos os “momentos” têm uma unidade motivada não apenas pelo mesmo enquadramento; há também uma relação de dependência lógica: o segundo momento considera as consequências do acontecido no primeiro. A primeira consequência da saudação de Maria é a alegria de João Baptista menino:

“O Batista, ainda por nascer, estremece…”

A câmera gira uma segunda vez e foca Maria:

“A humildade de Maria derrama-se no Magnificat”.

Pela terceira vez a câmera volta-se para nós:

“E tu e eu, que somos – que éramos – uns soberbos, prometemos ser humildes”.

7.13. Há uma correlação semiótica entre a humildade de Maria – que se verte no Magnificat – e a nossa soberba. Uma correlação no discurso motivada pela finalidade do texto. Cada cena considera particularmente uma virtude de Maria; neste caso a humildade; depois desta consideração, São Josemaria anima o leitor a melhorar, imitando na vida corrente a virtude que se acaba de considerar. Por isso, há uma correlação entre discurso e vida. A finalidade do texto, e da contemplação, é precisamente mover o leitor, aproximá-lo de Cristo.

O contraste entre a humildade (de Maria) e a soberba (nossa) provoca a vergonha, e depois a emulação: o propósito de ser humilde. Aristóteles define emulação como: “um pesar ao apresentarem-se, noutros, bens susceptíveis de poderem ser alcançados por alguém, e não pelo fato de pertencerem a outro, mas por não lhe pertencerem” (Retórica 1388 a, 31-35).

A emulação é primeiro lugar uma paixão: um sentimento de pena ao verificar que carecemos de certos bens; mas é uma paixão nobre, porque não se entristece ante o bem alheio – como a inveja –, mas perante a própria deficiência. Por isso, incita a melhorar, a tentar adquirir umas qualidades que se encaram como possíveis de alcançar. A emulação vai, pois, acompanhada de esperança; o que a diferencia da inveja é que procura o bem para si, e não o mal alheio: a inveja é a paixão dos desesperados. Movidos pela emulação, os homens tomam decisões: põem em marcha a vontade e adquirem hábitos, além de diversos bens. Os que cultivam a emulação enriquecem-se a si próprios; os invejosos, empobrecem os outros sem melhorarem eles próprios: esterilizam tudo. Por isso diz Aristóteles que emulação e inveja são paixões contrárias, embora possam parecer semelhantes.

A contemplação da humildade de Maria leva o autor e o leitor – como personagens da cena – à emulação: prometem ser humildes, isto é pelo menos o que estabelece o plano do texto. A decisão é sempre pessoal. O que se torna evidente é que o texto postula um tipo determinado de leitor modelo: alguém que, apesar dos seus defeitos, procura imitar as virtudes de Nossa Senhora: neste caso a humildade; e isso como condição de discurso: para poder atualizar plenamente a leitura, o sentido do texto. Mas este tipo de atualização leva-nos necessariamente, projeta-nos para fora do discurso: o leitor, introduzido no sobrenatural, acaba por fazer verdadeira oração.

7. 14. O compromisso realizado dentro do texto – “prometemos que seremos humildes” – projeta-se também fora do texto, e permanece na vida quotidiana, depois da leitura. Autor e leitor prometem ser humildes, logicamente, na vida real: no único “lugar” em que podem viver-se as virtudes; essa é precisamente a finalidade do Santo Rosário.

Além disso, não se projetam apenas os propósitos do texto para a realidade: também a contemplação passa agora a fazer parte da vida, e não apenas durante o “tempo de leitura”. Com efeito, as personagens do Santo Rosário, se o leitor o permitir, podem passar também a fazer parte da vida quotidiana, convertendo a vida em oração. Jesus, José e Maria podem passar a intervir – com o nosso consentimento – nas nossas realidades, tarefas e afãs diários: nisto pode consistir precisamente o “ser contemplativos no meio do mundo”.

Antonio Vilarnovo

“Santo Rosário: cena y contemplação no discurso”, in: La obra literária de Josemaría Escrivá (Editor: Miguel Ángel Garrido), Pamplona, Eunsa, 2002.