São Josemaria, os jovens, São Rafael e São João

Em 1932, são Josemaria teve a inspiração divina de invocar pela primeira vez aos patronos dos diferentes campos apostólicos que compõem o Opus Dei. Sob o patrocínio de São Rafael e de São João, enquadra-se o labor ou obra de São Rafael, nome com o que se denomina o apostolado que os fiéis do Opus Dei realizam com a juventude, sem constituir nenhuma associação ou agrupamento.

Em 1932, durante um Retiro espiritual, são Josemaria teve a inspiração divina de invocar pela primeira vez os patronos dos campos apostólicos do Opus Dei: os Arcanjos São Miguel, São Gabriel e São Rafael; e os Apóstolos São Pedro, São Paulo e São João. Sob o patrocínio de São Rafael e de São João, enquadra-se o labor ou obra de São Rafael, nome com o que se denomina o apostolado que os fiéis do Opus Dei realizam com a juventude, sem constituir nenhuma associação ou agrupamento[1].

A tarefa pastoral que a Obra desempenha a serviço da Igreja pode ser resumida em ensinar a muitas pessoas que todos os momentos e circunstâncias da vida podem ser ocasião de amor a Deus, e de serviço alegre e simples às almas. Mesmo que o Opus Dei e seus apostolados estejam abertos a qualquer pessoa, o labor com os jovens, esperança da Igreja, será sempre uma prioridade[2]. Por isso, quando se começa o trabalho apostólico em um novo lugar, a obra de São Rafael é a primeira a começar, e todos os fiéis da Prelazia, cada um na medida de suas possibilidades, colaboram com esta tarefa com o seu tempo e a sua iniciativa.

O objetivo essencial e imediato da obra de São Rafael é oferecer formação cristã e humana, tanto a universitários e estudantes de colégios, como a jovens de diversas profissões e condições sociais. Ajuda-se a aprofundar nas riquezas da fé e nas consequências de viver uma vida de acordo com o Evangelho e com os compromissos do Batismo, sempre de maneira prática e adequada às circunstâncias pessoais de cada um. Trata-se de ajudar as pessoas jovens a desenvolver as suas capacidades humanas e espirituais e as colocá-las a serviço de Deus e dos outros. Formar filhos fiéis da Igreja, cidadãos exemplares, cristãos livres e consequentes em sua vida profissional, familiar e social.

“A formação dos fiéis leigos tem como objetivo fundamental a descoberta cada vez mais clara da própria vocação e a disponibilidade cada vez maior para vivê-la no cumprimento da própria missão (...). Na vida de cada fiel leigo há, pois, momentos particularmente significativos e decisivos para discernir o chamamento de Deus e para aceitar a missão que Ele confia: entre esses momentos estão os da adolescência e da juventude”[3]. O labor de São Rafael facilita que os jovens tenham um encontro pessoal com Jesus Cristo e, como consequência, que cada um descubra novos horizontes vitais e corresponda à sua chamada na Igreja[4]. Esta tarefa sobrenatural de formação está impregnada do respeito à liberdade, característico do espírito do Opus Dei, e tem como objetivo despertar nos jovens o ideal de um compromisso cristão vivido plenamente. “Uma educação verdadeira deve suscitar a valentia das decisões definitivas, que hoje se consideram um vínculo que limita a nossa liberdade, mas que na realidade são indispensáveis para crescer e atingir algo grande na vida, especialmente para que amadureça o amor em toda a sua beleza; por conseguinte, para dar consistência e significado à nossa liberdade”[5].

A profunda formação espiritual e humana que recebem, coloca muitos jovens – com idade e maturidade suficientes para saber bem o que fazem – em condições de conhecer, preparar-se e corresponder à sua vocação cristã, com liberdade, alegria e responsabilidade. Logicamente, a maior parte dos que participam dos meios de formação do Opus Dei, no futuro, serão pais de família. Ensina-se a todos, como são Josemaria sempre insistiu, que o casamento é uma vocação divina autêntica para servir ao Senhor, fazendo da família um lar cristão, luminoso e alegre. Se quiserem, mais tarde, poderão participar do labor de São Gabriel. Outros percebem que Deus os chama ao Opus Dei vivendo o dom do celibato apostólico, escolha de amor que leva a entregar-se ao Senhor com todo o coração. Para estes, o labor de São Rafael costuma ser o meio ordinário para se preparar para receber a chamada divina ao Opus Dei como Numerários ou Adscritos. E, com a graça de Deus, também não faltam jovens aos que se orienta ao sacerdócio ou à vida religiosa, se sua vocação é essa.

Centros de São Rafael: ambiente

São Josemaria dispôs que nos centros de São Rafael tivesse emoldurado o texto do Senhor sobre o mandamento novo[6], como um lembrete do ambiente de caridade, de fraternidade humana e sobrenatural, que tem que presidir todo o labor que é realizado ali. O clima de carinho, de alegria, e de confiança que se respira – de família cristã – facilita que os que vão ao centro sintam a casa como própria, aprendam a ter detalhes de serviço com os outros, e colaborem com pequenos encargos materiais.

Por meio dos diferentes meios de formação, ensina-se aos jovens que, como Jesus Cristo, perfectus Deus, perfectus homo (perfeito Deus, perfeito Homem), para chegar à santidade, têm de ser muito humanos. Ser bons filhos de Deus comporta ser bons estudantes, bons profissionais, bons filhos, bons irmãos, bons amigos. Com exemplos práticos, explica-se o modo de se exercitar nas distintas virtudes cristãs, que nada mais é do que se identificar com os sentimentos que Jesus Cristo teve[7]: espírito de serviço, generosidade, amabilidade no trato, alegria, fortaleza, temperança, sinceridade, etc. Em particular, recorda-se frequentemente o valor humano e sobrenatural do estudo – que é obrigação grave[8] - e que devem exercitar a justiça e a caridade no cumprimento de seus deveres. Ao mesmo tempo, fala-se da responsabilidade por adquirir uma sólida formação profissional, com afã de servir melhor a sociedade. Como resultado do espírito de santificação por meio do trabalho ordinário, nos centros de São Rafael se cria um ambiente de laboriosidade e de aproveitamento do tempo.

Junto com as virtudes humanas, ajuda-se a descobrir e a crescer em amizade com Cristo no meio dos afazeres comuns. Neste sentido, um primeiro aspecto que se ensina é que a vida cristã requer uma sólida formação doutrinal que começa pelo estudo – ou a revisão – do Catecismo da Igreja Católica. Desde o começo se explica que “a vocação cristã, por sua própria natureza, é também vocação ao apostolado”[9]. Portanto, o autêntico progresso na vida espiritual – que se resume no progresso da virtude da caridade – se manifesta em um intenso apostolado com parentes, amigos e companheiros: rezar pelos que nos rodeiam, interessar-se por sua situação cristã e humana, e aproximá-los de Deus com extrema delicadeza. Em definitiva, transmite-se a todos um profundo sentido do amor cristão para que, de modo natural, o desejo eficaz de fazer apostolado vá crescendo. “Faze a tua vida normal; trabalha onde estás, procurando cumprir os deveres do teu estado, acabar bem as tarefas da tua profissão ou do teu ofício, superando-te, melhorando dia a dia. Sê leal, compreensivo com os outros e exigente contigo mesmo. Sê mortificado e alegre. Esse será o teu apostolado. E sem saberes por quê, dada a tua pobre miséria, os que te rodeiam virão ter contigo e, numa conversa natural, simples - à saída do trabalho, numa reunião familiar, no ônibus, ao dar um passeio, em qualquer parte -, falareis de inquietações que existem na alma de todos, embora às vezes alguns não as queiram reconhecer: irão entendendo-as melhor quando começarem a procurar Deus a sério”[10].

Direção espiritual

A direção espiritual aparece na vida da Igreja, como meio tradicional para acompanhar e orientar o cristão[11]. “Conheceis de sobra as obrigações do vosso caminho de cristãos, que vos conduzirão sem pausa à santidade; estais também precavidos contra as dificuldades, praticamente contra todas, porque se vislumbram já desde os começos do caminho. Agora insisto em que vos deixeis ajudar, guiar, por um diretor de almas a quem confieis todas as vossas aspirações santas e os problemas cotidianos que possam afetar a vossa vida interior, os descalabros que possais sofrer e as vitórias”[12].

No Opus Dei há uma ampla experiência da eficácia da direção espiritual que os sacerdotes e leigos proporcionam. É uma grande tarefa de apoio humano e espiritual para que muitas pessoas, com a ajuda da graça, encontrem a Cristo, no exercício generoso de sua liberdade e responsabilidade pessoais. Geralmente, facilita-se nos centros de São Rafael, mas também se pode fazer em uma igreja, na capelânia de uma universidade, em um colégio promovido por amigos ou fiéis da Prelazia, etc. Naturalmente, ao explicar a conveniência da direção espiritual se respeita a liberdade das consciências: oferece-se essa ajuda, eficaz para sua vida interior, aos que livremente desejam, sem impor a ninguém. Nos lugares onde seu grande valor é pouco conhecido, explica-se adequadamente, dando outro nome se for preciso, para que se entenda sua importância e utilidade.

“O exercício da direção espiritual não deve orientar-se no sentido de fabricar criaturas carecidas de juízo próprio, que se limitam a executar materialmente o que outrem lhe disse; Pelo contrário, a direção espiritual deve tender a formar pessoas de critério. E o critério implica maturidade, firmeza de convicções, conhecimento suficiente da doutrina, delicadeza de espírito, educação da vontade”[13]. As pessoas que procuram acompanhamento espiritual recebem alento para sua vida cristã. São impulsionadas a adquirir uma piedade profunda, baseada no espírito de filiação divina, orientada a conhecer e amar Jesus Cristo e, com Ele e n’Ele, ao Pai e ao Espírito Santo. Anima-se a cultivar o recurso confiado à Santíssima Virgem, o amor à Igreja, a veneração e o carinho ao Papa e aos Bispos. Orienta-se a frequentar os sacramentos e a começar e recomeçar suas lutas com alegria, humildade e confiança na graça.

Fala-se especialmente da santificação da vida quotidiana; como converter o trabalho em oração e cumprir, com espírito cristão, as obrigações de justiça e caridade, especialmente com os mais necessitados. Conversa-se de tudo o que pode favorecer a limpeza do coração, a santa pureza, indispensável para conseguir ter intimidade com Jesus[14]. Deste modo, também se reforça a própria personalidade. Estimula-se a imitar a fidelidade de Cristo ao Pai, com coerência, sendo sempre a mesma pessoa em casa, no trabalho, no trato com os amigos, na diversão e no descanso, sem mimetizar dependendo do ambiente. Os jovens recebem apoio para se manterem unidos à Cruz do Senhor, especialmente nos detalhes de serviço e no cuidado das coisas – pequenas e grandes – que tornam o trato com os demais mais agradável. Resumindo: ajuda-se a viver de maneira consequente e coerente com a fé, que é o caminho para ser feliz na terra e depois no Céu.

Amizade humana e sobrenatural

“O principal apostolado que nós, os cristãos, temos de realizar no mundo, o melhor testemunho de fé, é contribuir para que dentro da Igreja se respire o clima da autêntica caridade”[15]. Esta caridade que empapa toda a formação que se proporciona nos centros de São Rafael é vivida por meio da amizade humana e sobrenatural. “Para que este nosso mundo caminhe por um trilho cristão - o único que vale a pena -, temos de viver uma leal amizade com os homens, baseada numa prévia leal amizade com Deus”[16].

Como sempre fez são Josemaria, é preciso aprender a escutar, compreender, desculpar e animar com o exemplo e com uma exigência cheia de carinho e de paciência. Formar não se reduz a dar lições; ensinar e aprender vão unidos ao desejo de se servir mutuamente com alegria. O empenho sobrenatural e humano pela melhora espiritual dos jovens leva a atendê-los com solicitude e delicadeza, para que aprofundem progressivamente na relação com Jesus Cristo. Com a graça de Deus e uma amizade profunda e sincera, os jovens que participam dos meios de formação do Opus Dei, pouco a pouco, vão se aproximando do Senhor e se contagiam com o fogo do seu amor.

A amizade, além de meios sobrenaturais, exige tempo e generosidade. “Quando te falo de “apostolado de amizade”, refiro-me a uma amizade “pessoal”, sacrificada, sincera: de tu a tu, de coração a coração”[17]. Supõe abertura de mente e de coração e também um “esforço cordial por compreender as convicções dos nossos amigos, mesmo que não cheguemos a partilhar nem a aceitá-las”[18]. Logicamente, o apostolado poderá levar a convites a encontros de formação, mas isto não será mais do que uma manifestação de algo muito mais profundo e essencial que o fato de participar de algumas atividades determinadas. São Josemaria dizia que é preciso dedicar a cada alma o tempo que necessite, e colocava como exemplo a paciência dos monges da Idade Média para decorar – página por página – um códice. Facilita-se seu progresso acompanhando a cada um com compreensão, sem forçar; vendo sempre primeiro as coisas positivas de cada pessoa. E, quando alguém não responde, ou parece até que retrocede, é indispensável ter mais paciência ainda, ajuda-lo com a oração e com o trato pessoal: assim se demonstra também a retidão de intenção de uma amizade sincera.

Meios e instrumentos

“A atividade principal do Opus Dei consiste em dar aos seus membros, e às pessoas que o desejem, os meios espirituais necessários para viverem como bons cristãos no meio do mundo. Dá-lhes a conhecer a doutrina de Cristo, os ensinamentos da Igreja; Proporciona-lhes um espírito que os impele a trabalhar bem, por amor de Deus e a serviço de todos os homens. Trata-se, numa palavra, de se comportarem como cristãos: convivendo com todos, respeitando a legítima liberdade de todos e fazendo com que este nosso mundo seja mais justo”[19].

A transmissão da fé cristã é, antes de mais, o anúncio de Jesus Cristo, para Levar à fé n'Ele[20]. A vida cristã consiste fundamentalmente em ir ao encontro de Jesus e viver com Ele: procurá-lo, encontrá-lo e amá-lo constantemente[21]. Para podermos nos identificar com os sentimentos que preenchiam o seu coração de Redentor[22], precisamos conhecer cada vez melhor sua vida e seus ensinamento. Como explica Bento XVI, a mensagem cristã não é “só ‘informativa’, mas ‘performativa’. Significa isto que o Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera fatos e muda a vida”[23].

Para conseguir essa finalidade “performativa”, a obra de São Rafael conta com uma grande variedade de meios e atividades. Alguns correspondem aos que são Josemaria chamava “meios tradicionais”, que caracterizam de maneira essencial o apostolado que os fiéis do Opus Dei realizam com as pessoas jovens, e que não se deixam nunca – mesmo que existam dificuldades -, porque têm uma eficácia comprovada para o bem das almas. Além dessas, podem ser organizadas outras atividades, de muitos tipos – culturais, esportivas, etc. -, com uma orientação educativa e apostólica.

“Os percursos da santidade são pessoais e exigem uma verdadeira e própria pedagogia da santidade, capaz de se adaptar ao ritmo dos indivíduos”[24]. A tarefa de proporcionar esta “pedagogia da santidade” é ainda mais necessária em tempos de confusão doutrinal, porque falta a muitos jovens inclusive a preparação cristã mais básica[25]. Os meios de formação da obra de São Rafael constituem um processo educativo, uma escola de vida cristã, que se dirige à pessoa como um todo: inteligência, coração e vontade. Não se trata de apenas transmitir algumas ideias, mas de ajudar os jovens, de maneira livre e ativa, a fazerem a mensagem de Cristo vida de sua vida.

Cursos de formação, meditações, recolhimentos, retiros

No começo de 1933, São Josemaria deu o primeiro dos que depois se chamariam “círculos de São Rafael”. Os círculos de São Rafael são o eixo ao redor do qual se organizam o resto dos meios tradicionais. Incluem tanto o curso preparatório quanto os círculos profissionais.

O curso preparatório é um ciclo de sessões sobre a vida cristã. O temário é baseado no evangelho e no Catecismo da Igreja Católica, e contem explicações sobre os sacramentos, a oração, as virtudes cardeais e teologais, o sentido da filiação divina, o encontro com Deus no estudo, no trabalho, e nas relações sociais. As aulas são breves, têm um tom familiar e apostólico, e o enfoque é prático: ajudar a descobrir a beleza de viver a fé coerentemente nas circunstâncias do dia a dia de cada pessoa. Como complemento dessas aulas, quem dirige o curso conversa periodicamente com os assistentes que queiram, para tirar dúvidas, orientar e animar sua vida cristã e seu apostolado.

A participação no curso preparatório requer um mínimo de conhecimento da doutrina católica. Caso seja necessário, pode-se dar aulas sobre a fé – ou inclusive sobre virtudes humanas – para que os interessados adquiram as noções prévias fundamentais da vida cristã.

Ao acabar o curso preparatório, os que queiram podem começar os cursos profissionais. Esses têm o objetivo de proporcionar um conhecimento teórico-prático profundo da fé e da moral católica, que sirva para refletir e viver livre e responsavelmente a própria identidade cristã. Respondem à necessidade tão essencial para o cristão, de raciocinar partindo da fé, da vida de Cristo: “Todo o que crê, pensa; pensa crendo e crê pensando (...). Porque se o que se crê não se pensa, a fé é nula”[26]. Efetivamente, “o intelecto deve pôr-se à procura daquilo que ama: quanto mais ama, mais deseja conhecer. Quem vive para a verdade, tende para uma forma de conhecimento que se inflama num amor sempre maior por aquilo que conhece”[27].

O temário destes cursos é variado: abarca desde questões éticas e antropológicas fundamentais (sobre o casamento, a educação, o respeito à vida, etc.), até temas doutrinais de atualidade, que muitas vezes têm sua origem na publicação de um documento do Magistério da Igreja. Geralmente, durante uma primeira etapa, explicam-se matérias de interesse geral, adaptadas às circunstâncias dos participantes. Depois, num segundo ciclo do curso, pode-se tratar de temas especializados de deontologia profissional, por exemplo, agrupando os assistentes de acordo com suas profissões ou interesses parecidos. O Catecismo da Igreja Católica é um material de referência para a preparação destes ciclos.

Nos cursos profissionais, junto com a parte especulativa, anima-se os participantes a aproveitar os conhecimentos que recebem para alimentar e fortalecer sua vida cristã e o apostolado com seus familiares, amigos e colegas. Como dizia João Paulo II, a responsabilidade que supõe ter a fé “implica também amá-la e procurar obter a sua mais exata compreensão, de maneira a torná-la mais próxima de nós mesmos e dos outros, com toda a sua força salvífica, com o seu esplendor e com a sua profundidade e simplicidade ao mesmo tempo”[28].

Além dos cursos de formação, em cada centro de São Rafael se organiza pelo menos uma meditação semanal dirigida pelo sacerdote: um momento de oração a partir de algum texto do Evangelho, da liturgia do dia, etc. A oração é uma exigência da vida cristã: “o contato vivo com Cristo é a ajuda decisiva para prosseguir pela justa estrada (...) Quem reza não desperdiça o seu tempo, mesmo quando a situação apresenta todas as características duma emergência e parece impelir unicamente para a ação”[29]. Por isso, a pedagogia da arte da oração será sempre uma prioridade educativa na obra de São Rafael.

Quando é possível, a meditação costuma ser aos sábados, dia tradicionalmente dedicado à Virgem, como manifestação de amos à Mãe de Deus. Geralmente, depois da meditação tem a exposição e benção com o Santíssimo Sacramento e o canto da Salve ou de outra antífona mariana, de acordo com o tempo litúrgico. É mais uma expressão do lugar central que a Eucaristia ocupa na Igreja.

Mensalmente, há um dia de recolhimento e, ao longo do ano, são organizados retiros de vários dias de duração. São duas práticas recomendadas pela Igreja para alimentar a vida espiritual e alcançar a graça da conversão do coração[30]. Além disso, a experiência mostra que são também momentos propícios para aproximar parentes e amigos do labor de São Rafael.

Catequese e visitas aos pobres da Virgem

A catequese e as visitas aos pobres da Virgem são também meios tradicionais do labor de São Rafael. São muito favoráveis tanto para preparar os que depois poderão se incorporar aos círculos, como para complementar a formação dos que já assistem a esses círculos.

A catequese é uma obra de misericórdia espiritual – ensinar ao que não sabe[31] - que tem uma grande importância na missão da Igreja. Como dizia o cardeal Newman, “qualquer rapaz bem instruído no catecismo é, sem suspeitar, um autêntico missionário”[32]. Dentro da obra de São Rafael, preparam-se muitos catequistas, dispostos a ajudar nas paróquias, escolas, etc. As aulas de catequese são um traço muito próprio do espírito do Opus Dei: de fato, são Josemaria se referia à tarefa que o Opus Dei desempenha ao serviço da Igreja como “uma grande catequese”[33].

Com as visitas aos pobres, os jovens se exercitam na caridade, aprendem a sentirem-se solidários com as necessidades alheias, e descobrem de um jeito muito prático que o amor a Deus e ao próximo são inseparáveis[34]. Quando é possível, estas visitas são organizadas nas festas da Santíssima Virgem, já que uma das suas finalidades é honrar Nossa Senhora em seus pobres. No Opus Dei, desde o começo, procurou-se colocar os jovens em contato com as pessoas mais necessitadas da sociedade, para levar alívio e consolo. São Josemaria dizia que “a fortaleza humana da Obra foram os doentes dos hospitais de Madri: os mais miseráveis; os que moravam em suas casas, sem nenhuma esperança humana; os mais ignorantes daquela periferia extrema”[35] (Veja o artigo: O amor aos pobres em São Josemaria).

Além de ser um meio para amadurecer humana e cristãmente, responde a uma necessidade de todos os países. Até onde existe um maior desenvolvimento econômico, há pessoas necessitadas ou doentes ou sozinhas, sem ninguém que as atenda: “Cada dia vamo-nos tornando conscientes de quanto se sofre no mundo, apesar dos grandes progressos em campo científico e técnico, por causa de uma miséria multiforme, tanto material como espiritual. Por isso, este nosso tempo requer uma nova disponibilidade para socorrer o próximo necessitado”[36].

Convívios e outras atividades auxiliares do labor de São Rafael. Residências.

Além dos meios tradicionais, o labor de São Rafael se expande e se desenvolve também por meio de múltiplas atividades auxiliares, que são organizadas nos centros –palestras, sessões de trabalho, etc. -, que contribuem diretamente para melhorar a capacitação humana, cultural, profissional e religiosa das pessoas jovens.

Em cada país são promovidas as que melhor se adaptam às circunstâncias concretas, com criatividade: atividades de música, jornalismo, idiomas, literatura, debates, ciclos de técnicas de estudo, orientação profissional ou, simplesmente, tertúlias e encontros culturais. Unem-se a essas atividades as de tipo social: programas de ajuda ao desenvolvimento, atenção aos que têm necessidades especiais, etc. Todas estas iniciativas têm como característica comum um profundo sentido da solidariedade cristã e um conteúdo educativo, junto com o fato de que são labores laicos e seculares, realizados num ambiente de família, com mentalidade profissional e desejo de serviço à sociedade civil.

Os convívios são encontros que podem surgir por diversos motivos: um seminário sobre algum tema da atualidade, um curso de orientação profissional, dias de estudo mais intenso, um campeonato esportivo, um acampamento de promoção rural, uma excursão, etc. Sempre trazem uma experiência de amizade, de desenvolvimento humano e de crescimento intelectual, num contexto de vida cristã. Costumam acontecer nos fins de semana ou nas férias.

As residências universitárias são centros de excelência acadêmica e cultural, abertos a pessoas de todas as condições sociais, com o objetivo de preparar universitários que se destaquem profissionalmente, e incorporem ideais de serviço, de amor à verdade e de liberdade[37]. Caracterizam-se por ter um ar familiar, e por um ambiente de estudo, alegria, otimismo e compreensão, onde os residentes se tratam com naturalidade, delicadeza e amizade. A convivência os leva a praticar as virtudes humanas, a ser pessoas com mentalidade positiva e universal, que não discriminam, a forjar o caráter e a fortalecer a personalidade, As residências têm uma clara identidade cristã, mas estão abertas também aos não católicos, aos quais se recebe sempre com afeto e estima; e, quando querem, podem participar da formação religiosa que se proporciona.

Continuidade no labor de São Rafael. Apostolado epistolar.

“Ao terminar a aula, fui à capela com aqueles rapazes, tomei o Senhor sacramentado no ostensório, elevei-o, abençoei aqueles três…, e eu via trezentos, trezentos mil, trinta milhões, três bilhões…, brancos, negros, amarelos, de todas as cores, de todas as combinações que o amor humano pode fazer. E fiquei aquém, porque é uma realidade passado quase meio século. Fiquei aquém, porque o Senhor foi muito mais generoso”[38].

Dentro do amplo e variado panorama de santidade que tantos testemunhos da fé em Cristo deixaram na Igreja, os fiéis do Opus Dei meditam especialmente na vida de São Josemaria que, durante longos anos, desenvolveu um intenso trabalho pastoral com os jovens. Movidos por seu exemplo, todos na Prelazia sentem paixão pelo apostolado e, particularmente, um grande amor pelo labor de São Rafael. “O zelo é uma loucura divina de apóstolo, que te desejo, e que tem estes sintomas: fome de intimidade com o Mestre; preocupação constante pelas almas; perseverança que nada faz desfalecer”[39].

Como fruto deste espírito, os meios de formação da obra de São Rafael são preparados da melhor maneira possível, mesmo que só uma pessoa assista: com profissionalismo, de uma forma viva, com profundidade doutrinal e também com sentido pedagógico, para mostrar toda a beleza da fé. O Evangelho é velho e novo ao mesmo tempo e, por isso, a tarefa de aproximar as pessoas de Jesus Cristo através dos meios de formação também é algo sempre novo, cheio de vida.

O labor apostólico se desenvolve com ordem e continuidade e não se interrompe em nenhuma época do ano. Durante as férias, as atividades são adaptadas às circunstâncias dos jovens, para que continuem crescendo em maturidade humana e sobrenatural, e em sentido apostólico. Continua-se em contato também com os que viajam: São Josemaria viveu e recomendou praticar com generosidade o chamado “apostolado epistolar”[40], como manifestação de verdadeira amizade e caridade cristã, e estímulo para fortalecer a fé.

M. Díez

Tradução dos artigos Labor de San Rafael (I) e Labor de San Rafael (II), publicados no site www.collationes.org.

básica

Catecismo da Igreja Católica, nn. 1435, 2695

São João Paulo II, Exortação apostólica Christifideles laici, 30-XII-1988, nn. 57-64

São Josemaria, Caminho, nn. 56-80; 360-386; 902-928

São Josemaria, Sulco, nn. 727-768

Andrés Vázquez de Prada, O Fundador do Opus Dei, vol I, Quadrante


[1] O recurso a São Rafael tem suas raízes na Sagrada Escritura, que conta como o ancião Tobit pede ao Arcanjo São Rafael que cuide de seu filho Tobias, para “ir com ele e fazer- lhe de guia” (Tb 5,10), numa longa viagem, durante a qual o rapaz conhecerá os desígnios de Deus sobre sua vida.

[2] Cfr. Concílio Vaticano II, Declaração Gravissimum Educationis, n. 2.

[3] São João Paulo II, Exortação apostólica Christifideles laici, n. 58.

[4] “Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo” (Bento XVI, Enc. Deus caritas est, n.1).

[5] Bento XVI, Discurso aos participantes da IV Assembleia eclesial nacional italiana, Verona, 19-X-2006.

[6] Mandatum novum do vobis: ut diligatis invicem, sicut dilexi vos, ut et vos diligatis invicem. In hoc cognoscent omnes quia discipuli mei estis, si dilectionem habueritis ad invicem: “Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros. Nisto conhecerão todos que sois os meus discípulos: se vos amardes uns aos outros” ( Jo 13, 34-35).

[7] Cfr. Flp 2, 5 ss.

[8] Cfr. São Josemaria, Caminho, n. 334.

[9] Concílio Vaticano II, Decreto Apostolicam Actuositatem, n. 2; cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 863.

[10] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 273.

[11] Por exemplo, cfr. Catecismo da Igreja Católica, nn. 1435, 2695.

[12] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 15; cfr. Caminho, nn. 59, 60, 62, 63.

[13] Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n.93.

[14] Cfr. Mt 5, 8; Catecismo da Igreja Católica, n. 2336.

[15] São Josemaria, Amigos de Deus, n. 226.

[16] São Josemaria, Forja, n. 943.

[17] São Josemaria, Sulco, n. 191.

[18] São Josemaria, Sulco, n. 746.

[19] Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n. 27.

[20] Cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 425.

[21] Cfr. São Josemaria, Caminho, n. 382.

[22] Cfr. Fl 2,7.

[23] Bento XVI, Encíclica Spe salvi, n. 2.

[24] João Paulo II, Carta Apostólica Novo Millennio Ineunte, n. 31

[25] “Na gênese e difusão do ateísmo, «os crentes podem ter tido parte não pequena, na medida em que, pela negligência na educação da sua fé, ou por exposições falaciosas da doutrina, ou ainda pelas deficiências da sua vida religiosa, moral e social, se pode dizer que mais esconderam do que revelaram o autêntico rosto de Deus e da religião» (Catecismo da Igreja Católica, n.2125).

[26] Santo Agostinho, De praedestinatione sanctorum, 2, 5: PL 44, 963.

[27] João Paulo II, Encíclica Fides et ratio, n. 42.

[28] João Paulo II, Encíclica Redemptor hominis, n. 19.

[29] Bento XVI, Encíclica Deus caritas est, n. 36.

[30] Por exemplo, cfr. Concilio Vaticano II, Decreto Apostolicam Actuositatem, n. 32; Catecismo da Igreja Católica, nn. 1435 e 1438.

[31] Cfr. Catecismo da Igreja Católica, n. 2447.

[32] Card. J.H. Newman, Sermão na inauguração do Seminário de São Bernardo, 3-X-1873.

[33] Cfr. Carta 15-VIII-1964, n. 1, em A. Vázquez de Prada, El Fundador del Opus Dei, tomo III, p. 536; ou também, Entrevista a San Josemaría no jornal ABC de Madrid, 24-III-1971.

[34] Cfr. 1 Jo 4, 20-21.

[35] São Josemaria, Meditação, 19-III-1975, em A. Vázquez de Prada, El Fundador del Opus Dei, tomo I, p. 443. Cfr. J. González–Simancas y Lacasa – J. Revuelta Somalo, San Josemaría entre los enfermos de Madrid (1927-1931), “Studia et Documenta”, 2 (2008) 147-203.

[36] Bento XVI, Encíclica Deus caritas est, n. 30

[37] Cfr. Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n. 84.

[38] São Josemaria (cfr. AGP, P04 1975, p. 278), em A. Vázquez de Prada, El Fundador del Opus Dei, tomo I, p. 482.

[39] São Josemaria, Caminho, n. 934.

[40] Cfr. São Josemaria, Caminho, nn. 976-977.