“Guadalupe tinha ímã”

Ester Teixeira tem antepassados portugueses. Originária da Galícia, mora em Portugal desde dezembro de 1951, e conta a sua recordação de Guadalupe Ortiz de Landázuri, mulher do Opus Dei que será beatificada em Madri no próximo dia 18 de maio.

Conheci a Guadalupe numa viagem que fez à Galícia. Na minha família, todos tínhamos uma vida de piedade bastante intensa: missa, visita diária ao Santíssimo na igreja, confissão com frequência. Na altura, só o meu pai não era praticante.

Eu queria fazer algo pela Igreja. Era Presidente da Ação Católica, já conhecia Caminho por recomendação do meu confessor. Das minhas irmãs, uma tinha casado e outra ia casar em breve. Eu, que era a mais nova, sabia que queria fazer alguma coisa por Deus e que podia muito bem ser casar-me ou não.

Pelos meus encargos, como tinha várias coisas a tratar, um dia fui de manhã à sede da Ação Católica. Ainda hoje me pergunto: Porque fui lá aquela manhã? Porque foi ali também o meu confessor aquela manhã? Foi ele que me disse: “Estão aqui as do Opus Dei, como tu tens o problema de vocação, fala com a Guadalupe!” E apresentou-nos.

Lembro-me bem que era de uma simpatia enorme, vestia-se de um modo elegante e discreto. Marcamos um encontro para aquela tarde. Começamos a falar. Comecei a sentir que a Guadalupe tinha um ímã. Ia avançando. Como, à medida que me explicava o que era a Obra, se dava conta de que aquilo era para mim, falou-me logo de ir para Madri quanto antes e ficamos de continuar no dia seguinte.

Antes de adormecer, a seguir a essa segunda conversa, no meu quarto, escrevi uma carta ao Fundador pedindo para ser do Opus Dei. Estávamos em abril de 1948.

Ester com o atual Prelado, Mons. Fernando Ocáriz

Faltava a comunicação aos meus pais da minha decisão. Pensei que devia fazê-lo na festa do Espírito Santo. O meu pai, apesar de não praticar e de lhe custar muito a minha partida, disse que não queria pôr obstáculos à minha felicidade.

Em Madri, a Guadalupe estava à minha espera na estação de Atocha. De lá, fomos para Zurbarán. A Guadalupe era Diretora da Residência. Encantou-me logo o ambiente de família que se respirava. Sempre com a sua simpatia e atração, acolheu-me (disse-me a que horas se almoçava, mostrou-me o oratório, e insistiu em que fosse descansar um pouco, por ter passado a noite em viagem). Explicou-me que iria para Los Rosales, onde decorria um período breve de formação mais intensa. Entrei no ônibus para Villaviciosa de Odón, perto de Madri, onde me iriam esperar.

Também me aconteceram peripécias na cozinha, pela minha inexperiência, mas estava sempre por ali o meu “advogado de defesa”, que me descontraía

O nosso Padre passou por lá e numa meditação muito breve, porque o esperavam outros afazeres, falou-nos de expansão. Cada uma começou a ver-se em diferentes partes da Europa. A maior parte ia para Madri. Eu fui para Zurbarán, onde estava a Guadalupe, que na altura, além de muitos outros trabalhos, fazia a tese: realmente, de dia, fazia apostolado, dava círculos a muita gente nova, com quem conversava pessoalmente, e à noite, dedicava-se à tese; por isso, de vez em quando, se se encostasse em uma parede, dormia. Eu era a secretária e encarregava-me da cozinha. Na primeira quinzena, faltavam-me pesetas no balancete e fiquei aflita. A Guadalupe acalmava-me, descomplicava e garantia que o dinheiro havia de aparecer. De fato, assim foi. Também me aconteceram peripécias na cozinha, pela minha inexperiência, mas estava sempre por ali o meu “advogado de defesa”, que me descontraía.

A partir daí, já nos separamos: a Guadalupe saiu de Zurbarán. Um ano depois, fui eu que parti, primeiro para Santiago de Compostela, e depois para Portugal.