Conheci São Josemaria no dia 2 de Novembro de 1948

Oferecemos o trecho do livro " Recordações sobre Mons. Escrivá" que relata o dia em que Dom Javier Echevarría, prelado do Opus Dei, conheceu São Josemaria Escrivá.

- Javi! E acrescentou já com uma voz muito débil, quando o Pe. Javier entrava no quarto: – Não me sinto bem. Foram as últimas palavras de Josemaria, Fundador do Opus Dei, aqui na terra. Era o dia de 26 de Junho de 1975, em Roma. E foi o Pe. Javier Echevarría a pessoa que escutou essa frase final, depois de vinte e cinco anos de convivência diária. Nestas linhas, evoca as suas primeiras impressões, no dia em que conheceu o Fundador do Opus Dei.
Foi em Madrid, em 2 de Novembro de 1948, num Centro do Opus Dei da Rua Diego de León. Juntamente com outros membros da Obra, participei de uma tertúlia com mons. Escrivá, em que nos falou de fidelidade à vocação e da necessidade de convertermos a nossa vida num apostolado contínuo. Depois, mons. Escrivá tinha de ir a uma casa de retiros nas proximidades de Madrid, chamada Molinoviejo,que estava acabando de ser reformada, e disse-nos a três dos presentes que, se dispuséssemos de tempo, podíamos acompanhá-lo . Foi cantando durante todo o trajeto, e fez-nos ver que devíamos estar muito contentes por sermos filhos de Deus e por termos recebido a chamada para o Opus Dei, a fim de servir a Igreja e as almas. Sublinhava com energia que devíamos dirigir para Deus todas as tarefas e ocupações humanas; e dava como exemplo as canções que, surpreendidos com a sua naturalidade, alegria e entusiamos, acabávamos de escutar-lhe. Acrescentou que se servia da letra dessas canções para conversar com o Senhor e Santíssima Virgem.
Fiquei enjoado durante a viagem e tivemos que parar e descer do carro para limpar o assento e a minha roupa. O terno estava completamente manchado, e mons. Escrivá saiu em minha ajuda sem nenhuma repugnância. Ao ver a minha vergonha, tirou importância ao incidente, tratou-me com um afeto extraordinário e, já de novo no automóvel,fez abrir a janela para que eu recebesse vento na cara, ainda que o frio pudesse incomodá-lo.
Antes do meu enjoo, tinha brincado, apontando, como se fossem a casa de retiros, para algumas construções pequenas e deterioradas que se divisavam ao longe;divertia-se ao ver a nossa cara de decepção: Não, não é aquela, ainda temos de continuar. Mas esteve atento ao meu estado: Sentes-te bem? Não te preocupes, que estamos estamos chegando; não aconteceu nada. Quando chegarmos, vão-te limpar o terno, tomarás alguma coisa que te acalme o estômago e te sentirás melhor do que antes.
Eu fiquei admirado com a naturalidade tão paternal e maternal com que me tratou; falava-me como se nos conhecêssemos há muitíssimo tempo.

Desde que me nomeou seu secretário, sendo eu tão moço, disse-me: Podes abrir e fechar com toda a liberdade todos os armários e mesas que uso, e olhar tudo o que tenho. Para mim, foi uma prova de confiança imerecida, se se pensar na figura e na categoria sobrenatural do Fundador do Opus Dei.
Quando me designou “Custos” para os aspectos de carácter material, em 1956, pude verificar o que lhe tinha ouvido alguma vez: que vivia como numa casa de vidro, porque os mais próximos sabiam quando se levantava e se deitava, se estava no oratório ou trabalhando, quando tinha as refeições, a que horas saía de casa ou com quem estava. A sua conduta explicava-se também porque era ordenadíssimo e queria que, se precisassem dele, pudessem localiza-lo imediatamente.
Quando comecei a trabalhar ao seu lado, nos anos cinquenta, a reação que me causou foi de que estava diante uma pessoa humanamente cheia de qualidades, que o tornavam amável, afável, carinhoso, atraente, serviçal, atento aos outros, com capacidade de perceber as necessidades e os momentos em que se experimentava alguma preocupação; diante umbom mestre que sabia animar e corrigir; diante de um superior que dava confiança aos seus colaboradores; e sobretudo, diante de um sacerdote e um Padre, de um Pai, que dia a dia, a cada instante, por meio do seu trabalho, se dedicava com inteireza a servir a Deus e às almas, metido numa oração muito intensa.


Trecho do livro: Javier Echevarría Rodríguez e Salvador Bernal Fernández, Recordaçõessobre Mons. Escrivá, Diel, Lisboa, 2000